O mito
É inevitável que todas as vezes que estou usando uma lanterna a pergunta de alguém próximo é sempre a mesma: ‘Quantos lúmens tem a sua lanterna?’. E a resposta também é a mesma: ”O que são lúmens?”
Parece um consenso comum que muitos querem cada vez mais lúmens, mas não sabem exatamente o que são lúmens. Portanto, vou abordar um pouco sobre o tema para ser base para outros artigos.
Comparar e adquirir equipamentos somente pela quantidade de luz, torna a decisão e observação muito limitada. A quantidade de lúmens não define a qualidade do equipamento de iluminação, isto é um mito. Existem outros parâmetros que ajudam a definir a qualidade de uma lanterna, mas é preciso saber antes disso o que são lumens e como ele é definido no mundo das lanternas de mão.
O que a Física nos diz
Uma das grandezas físicas básicas ou fundamentais existentes no Sistema Internacional de Unidades (SI) é o da intensidade luminosa, sendo a sua unidade a candela com o respectivo símbolo cd. Desde 1979 é definida oficialmente como a intensidade luminosa, numa dada direção, de uma fonte que emite uma radiação monocromática de frequência 540 x 1012 hertz e que tem uma intensidade radiante nessa direção de 1⁄683 watt por esferorradiano.
Desta temos as unidades derivadas do SI, com algumas delas com nomes especiais. Para nós o que interessa no momento são as duas grandezas:
– fluxo luminoso, com a unidade lumen, e símbolo lm.
– luminosidade, com a unidade lux, e símbolo lx.
Lux é quantidade de luz que está chegando em um ponto. Esta relação é dada entre a intensidade luminosa e o quadrado da distância (l/d²). A iluminância pode ser medida através de um luxímetro.
O que são Lúmens?
De uma maneira bem simplificada, Lúmen (lm) é a quantidade de Luz/Fluxo Luminoso total emitida pela fonte de luz, independente da distribuição da luz, capaz de produzir estímulo ou sensibilizar o olho humano.
Imagine agora o Sol. Ele irradia luz para todos os lados. Imagine o flash do deu celular. Este irradia a luz para uma determinada direção. Em ambos os casos, a luz que é emitida por eles seria dada em lúmens.
De maneira bem genérica, podemos dizer que, quanto mais lúmens mais brilhante é uma luz.
Enquanto o Lúmen e a Candela são constantes, o Lux e (variável). Com o aumento da distância a quantidade de Lux que chega até o local que está sendo iluminado diminiu.
É possível convertermos algumas destas grandezas com fórmulas matemáticas:
Candela para lumens, Candela para lux, Footcandles para lux, etc. Caso queira ver essas formulas em ação, acesse este link https://www.rapidtables.com/calc/light/index.html. Note que para alguns cálculos você precisará de alguns dados como ângulos e distâncias.
Em algum momento começamos a ter problemas com os lúmens, não com ele em si, mas como ele é medido para o uso em lanternas. Explico. Alguns fabricantes e entusiastas medem a quantidade de luz que sai diretamente do emissor de luz, ou seja, no caso mais comum hoje em dia, é medida logo depois do led. Outros medem a luz irradiada diretamente depois da lente da lanterna e o termo em inglês para isso é OTF (out of the front).
Por causa dessas e outras discrepâncias, em 2009 o ANSI (American National Standards Institute – o equivalente no Brasil é a ABNT), junto com alguns fabricantes* determinaram algumas normas para o desempenho básico de lanternas de mão/portáteis, holofotes e
lanternas de cabeça que fornecem iluminação direcional. O documento foi intitulado de ANSI/NEMA FL 1-2009. Neste é possível encontrar algumas definições técnicas como distância do beam, autonomia, saída de luz, etc. Tudo isso para o consumidor estar comprando algo que é testado e vendido segundo uma padronização. E em 2016 e recentemente com uma revisão em 2019, alguns fabricantes criaram o ANSI/PLATO FL 1 2019 Standart, com o intuito de “informar os fabricantes sobre quaisquer problemas descobertos pelo processo de teste e tenta trabalhar em colaboração para resolver discrepâncias entre os resultados dos testes e as marcações do produto.”**
Para pesquisas o que o leitor encontrará mais em materiais na internet são os termos ANSI ou ANSI FL1.
E o que definem o ANSI/PLATO sobre:
– Distância do feixe de luz (beam distance): é a distância do dispositivo no qual o feixe de luz é de 0,25 lux (0,25 lux é aproximadamente o equivalente à luz emitida da lua cheia “em uma noite clara em campo aberto”).
– Intensidade do feixe de pico (peak beam intensity) Intensidade de pico do feixe é a intensidade luminosa máxima tipicamente ao longo do eixo central de um cone de luz. O valor é relatado em candela e não muda com a distância.
– Autonomia (runtime): é definido como a duração do valor inicial da saída de luz – definido como 30 segundos após o ponto em que o dispositivo é ligado pela primeira vez – usando baterias novas, até que a saída de luz atinja 10% da valor inicial.
– Saída de luz (light output): é o fluxo luminoso total. É a quantidade total de energia luminosa total emitida, medida em integrando toda a saída angular da fonte de luz portátil. A saída de luz neste padrão é expresso em unidades de lúmens.
No ANSI-FL1 Os valores são medidos a distâncias de 2 ou 10 ou 30 metros da frente da superfície da lente do dispositivo a ser testado. A distância de teste escolhida deve ser pelo menos 10 vezes a maior dimensão da lente ou altura ou largura da saída do dispositivo. O dispositivo de medição de luz vai identificar e será registrado o valor mais alto indicado. As medições devem ser realizadas 30 segundos a 2 minutos após o dispositivo ser ligado.
Existe um padrão entre os ícones usados pelos fabricantes que adotam o ANFI-FL1 e PLATO, e como evitarei publicação dos mesmos por questões de direitos autorais, você poderá visualizar os mesmos aqui https://www.plato-usa.org/about/standard. Em tempo, aproveite e veja no hiperlink mencionado a lista de participantes do comitê do PLATO.
Esfera usada para medir o fluxo luminioso
Depois de ler tudo isso vamos simplificar um pouco.
Depois de ler tudo isso vamos simplificar um pouco.
O que interessa para nós:
Lúmens é tudo o que sai.
Lux é quantidade de luz no(s) objeto(s) iluminado(s).
Candela é a distância máxima que o dispositivo vai iluminar.
Na prática
A quantidade de lumens é boa como comparação entre dois equipamentos de iluminação portateis, no que diz respeito a quantidade de luz que o dispositivo emite, desde que ambos utilizem o padrão ANSI-FL1/PLATO. Mas precisamos de mais duas considerações no dia-a-dia.
O formato do feixe de luz define exatamente o que os olhos interpretam quando a luz é refletida em um ou mais objetos. Ele é de extrema importância, pois, cada modelo/versão de dispositivo, com ou sem ajustes específicos do beam, emitirá a luz em um formato diferente. E em cada parte que forma o seu feixe de luz (hospot e spill) , teremos uma quantidade e luz chegando. Sendo assim, o formato do beam é tão ou até mais importante do que a quantidade de lúmens para alguns usos específicos. Veja sempre os beamshots (mencionados no artigo anterior).
Outro ponto a considerar são como a sua fonte de luz é alimentada e a fonte de energia.
Na sua grande maioria de vezes dos dispositivos de iluminação atuais é usado um ou mais leds para gerar luz. Temos HID e incandescentes também, mas vamos nos abranger os leds por serem mais comuns.
Os leds precisam de uma quantidade de tensão e corrente elétricas para funcionar. Em poucos casos os leds podem ser iluminados diretamente ligados a fonte de energia, como as baterias CR123 ou AA, mas na grande maioria de vezes é usado um driver. O driver é o conjunto de componentes eletrônicos que compõem o circuito eletrônico que fornece energia para o led, ou seja, liga o led. Existem vários tipos de drivers. De uma maneira bem resumida, alguns tem a saída regulada de luz e outros não reguladas.
Algumas vezes você encontrará saída regulada ou estabilizada também.
Para explicar isso vou usar o gráfico de autonomia da Armytek Predator 2.5. Esta lanterna em questão não é mais fabricada, mas tinha a função onde o usuário poderia definir o tipo de saída de luz da lanterna, entre regulada (FULL), SEMI (em forma de uma curva) e STEP(em forma de escada). O que é chamado de SEMI no gráfico seria a não regulada muito comum em diversas lanternas.
Vamos analisar o gráfico pegando somente os valores da linha verde e amarela, ou seja, o FULL e SEMI neste caso.
Para a mesma fonte de energia, pilha ou bateria, a lanterna consegue fornecer a mesma quantidade de luz por mais de 46 minutos no modo de saída regulada. Já no modo chamado de SEMI, no caso a não regulada, a lanterna fornece uma quantidade de luz por mais de 130 minutos, mas a quantidade de luz vai decaindo. E muito isso é importante.
Dependendo da lanterna que lhe é apresentada é importante saber se a saída é regulada ou não, para saber se ela atenderá às suas expectativas. O tipo de saída de luz, sendo regulada ou não, jamais definirá a qualidade de seu equipamento, mas o que foi determinado no projeto. Vamos ver isso como funciona:
Olhe o gráfico. O modo de saída regulada em verde, proporciona a maior quantidade de luz possível, mas a sua autonomia é menor. Imagine em uma situação real de seu dia-a-dia como isso seria ou não complicado. Você acabou de engajar um suspeito dentro de sua casa, já ligou para a polícia e fica no aguardo deles chegarem. Depois de 10 minutos a sua bateria acaba. O que você faria? No mesmo exemplo, tendo a lanterna centenas de lúmens e uma saída regulada ou não, é necessário usar tanta luz para iluminar tão perto? Fica a questão para você pensar e testar o seu equipamento para ver se ele vai te atender bem.
Aproveito para perguntar para você que, no caso de usar baterias recarregáveis, se elas estão complemente carregadas e qual o tempo máximo delas que você pode usar? Faça os testes.
Então você deve usar a saída não regulada? Não. Na verdade você deve conhecer o seu equipamento antes de usá-lo.
A Surefire que é uma referência no mundo de lanternas táticas, não tem em seu portifólio lanternas com saída de luz regulada . Mas a Streamlight que é outra referência no assunto, tem várias lanternas com saída regulada.
Por isso é importante retomar o que foi mencionado no artigo anterior: veja os reviews (testes), runtime (autonomia) e beamshots (fotos do feixe de luz).
Em tempo. As lanternas táticas atuais de renomados e confiáveis fabricantes usaram por muitos anos as baterias CR123. A grande maioria deles tem agora produtos que funcionam com as baterias recarregáveis de li-ion (16650, 18650, etc). E dependendo do equipamento e fonte de energia, a lanterna pode mudar de saída regulada ou não. Para o mesmo modelo de lanterna, a saída de luz pode ser regulada com 18650 e não regulada para CR123. No caso de lanternas multi-modos, algumas também podem ser reguladas e não reguladas dependendo do modo acionado. Por isso tudo é importante conhecer e testar o equipamento.
Depois de tudo passar toda essa informação, espero que o leitor comece a entender que lúmens não são tudo em uma lanterna.
* Lista de fabricantes que ajudaram a compor o ANSI-FL1
Dorcy International Columbus, OH 43217
Princeton Tec Bordentown, NJ 08505
Coast Portland, OR 97218
Surefire, LLC Fountain Valley, CA 92708
Golight Culbertson, NE 69024
Petzl Clearfield, UT 84016
The Brinkman Corporation Dallas, TX 75244
Energizer Holdings Westlake, OH 44145
ASP Inc. Appleton. WI 54912
Streamlight, Inc. Eagleville, PA 19403
Cat Eye Co., Inc. Boulder, CO 80302
Black Diamond Salt Lake City, UT 84124
The Coleman Company Inc. Wichita, KS 67219
Duracell, Inc. Bethel, CT 06801