1. Questões introdutórias
Não é de se estranhar a formulação de questionamentos sobre a enorme distância ou disparidade entre “teoria” e “prática” em qualquer ramo do conhecimento humano, especialmente nos bancos escolares, técnicos ou acadêmicos. No campo de estudos sobre os temas de autoproteção armada a situação não é diferente, seja em relação às técnicas, às táticas, aos procedimentos e às consequências das ações.
Na mesma linha de pensamento, existe um aparente abismo entre a vida prática e as consequências jurídicas ligadas ao uso e emprego das armas de fogo, tais como: interpretação e aplicação errônea das leis, criação de mitos e paradigmas, decisões judicias equivocadas, burocracia jurídica e processual, garantismo penal exacerbado e indevido, reflexos indevidos na segurança pública, dentre outras questões.
O problema disso tudo é que comumente não se estuda de modo interdisciplinar os aspectos da vida prática e do Direito. Explico.
Todas as condutas humanas podem ter ou não impactos na esfera jurídica, a depender do seu enquadramento ou da possível violação a determinadas normas. Isso implica possível responsabilização pessoal nas esferas penal, civil e administrativa, de cidadãos comuns ou agentes de segurança pública. Para os fins de autoproteção armada, o raciocínio é exatamente o mesmo. Uma ação com armas de fogo pode ter finalidade tática, no sentido protetivo, e ao mesmo tempo ser objeto de avaliação jurídica.
Embora não seja um tema muito discutido, inúmeras questões de ordem prática se entrelaçam às questões jurídicas quando se trata do uso e emprego de armas de fogo. Seguem alguns exemplos pertinentes:
- Toda vantagem tática significa alinhamento com as normas jurídicas? Por exemplo: fugir do embate armado é um direito ou dever do cidadão que porta arma de fogo? E para os agentes da lei, essa situação jurídica se modifica?
- Sacar uma arma e apontá-la apenas com o fim dissuasório, ou efetuar disparos de advertência, são táticas adequadas e desejáveis em quaisquer cenários? Referidas condutas terão consequências jurídicas positivas ou negativas?
- Disparar contra um agressor armado ao perceber os primeiros movimentos hostis seria uma vantagem tática com respaldo na lei? Sempre é possível identificar uma agressão armada iminente? A lei define as características e situações diferenciadoras de um ato hostil inofensivo, de riscos potenciais ou de agressões iminentes?
- O que seria uma reação armada proporcional, à luz da técnica e da tática? A proporcionalidade da força empregada integra o conceito de legítima defesa?
- Qual é o objetivo tático dos disparos no agressor? Qual é o objetivo jurídico quando se age em legítima defesa?
- Quais medidas são capazes de evitar ou diminuir o erro do disparo contra o agressor, passível de acertar terceiros ou gerar danos colaterais? Esse tipo de erro implica responsabilização jurídica?
- Como avaliar a existência uma agressão e adotar a melhor postura tática? Como posso provar que a minha decisão foi correta ou adequada juridicamente, mediante aquelas circunstâncias?
As respostas às questões de cunho essencialmente tático ou operacional não serão exploradas diretamente neste artigo, se não de modo tangencial. Já as respostas aos questionamento jurídicos dependem da verificação de fatores variados para cada situação, a que chamamos de contexto circunstancial, podendo-se citar: previsão legal proibitiva, permissiva ou impositiva; se há uma conduta por ação ou por omissão; se há um dever ou um mero direito de agir; se quem praticou a conduta dispunha de algum status jurídico ou situação especial; o momento, a duração e intensidade das ações e reações; os motivos e as intenções; os resultados, dentre outros.
Introduziremos no portal infoarmas uma série de discussões sobre a inter-relação do sistema tático com o sistema jurídico, sob os ângulos prático e teórico, enfoque quase nunca abordado nos bancos universitários e muito pouco enfatizado nas escolas policiais e nas instruções de tiro e de autodefesa. A relevância do tema é notória, por ampliar os conhecimentos e habilidades dos referidos universos de aplicação, desmistificando o Direito e, ao mesmo tempo, trazendo a tática para a realidade jurídica.
Pela necessária extensão desse novo ângulo de abordagem, faremos uma trilogia. Dividiremos o artigo em 3 (três) partes, em publicações sequenciais, de modo a analisar todos os 5(cinco) elementos do sistema tático de autoproteção: prevenção, fuga, não reação, negociação e reação.
Nesta primeira publicação, um pouco mais densa, trataremos das noções básicas e distintivas, e introduziremos o elemento prevenção. Na segunda parte, trataremos da fuga e da não reação. Por fim, na terceira e última parte, abordaremos os 2(dois) últimos elementos do sistema, que são a negociação e a reação armada propriamente dita, bem como seus desdobramentos jurídicos.
Vamos descortinar então a primeira parte deste artigo.
2. Delimitação do sistema tático de autoproteção
No espectro social, autoproteção significa preservação da própria vida e dos seus bens, materiais e imateriais, em face de possível agressão a esses direitos e interesses. Por tratar de um amplo leque de medidas ativas ou passivas, o termo autoproteção pode ser considerado mais amplo e adequado que o mero conceito de defesa pessoal ou autodefesa.
As medidas de autoproteção podem ser consideradas como um sistema quando formam um conjunto integrado de elementos ou componentes para um objetivo definido, que é a manutenção e a integridade da vida, da saúde e dos bens patrimoniais e da personalidade dos indivíduos.
A presente abordagem ganha relevância quando trata propriamente do emprego operativo das armas e munições em prol da defesa do indivíduo, de terceiros ou da coletividade, incluindo os respectivos resultados das ações, seja no contexto civil ou das forças de segurança de um Estado nacional. Como as medidas de autoproteção se destinam à obtenção da situação mais vantajosa possível para garantir os propósitos do indivíduo armado, dentro de um contexto de opções conflitivas, pode-se classificá-lo como um sistema com finalidade tática, individual ou coletiva.
Por tática, palavra que deriva de significação bélica ou proveniente da arte da guerra, compreende-se o método ou a habilidade para realizar com eficácia certas tarefas, em prol de determinados objetivos, definição que também se aplica ao tema proposto. Mas será que somente se impõem duas opções táticas diante de riscos potenciais ou de iminentes agressões: a reação armada ou a fuga?
Conforme conceituação adotada por Cleidson Vasconcelos no Livro “Armas de fogo e autoproteção”, o sistema de autoproteção aqui estudado pode ser decomposto em 5 (cinco) elementos de ordem tática: prevenção, fuga, não reação, negociação e reação.
Em breve síntese, a prevenção é a evitação da situação de confronto por meio de medidas ativas e passivas que impedem a colocação do agente na cena da ocorrência. A fuga é o abandono da situação e do local do fato, sem qualquer tipo de embate. A não reação (ou inércia) se revela como o não enfrentamento, mantendo-se no local da ocorrência, com possível submissão à agressão. A negociação é a tentativa de debelar a ameaça ou agressão pela via branda do convencimento, sem deflagrar reação corporal. Já a reação é um ato de enfrentamento físico, seja por medidas dissuasórias, seja por concretas ações reativas, incluindo o uso da força letal.
O que vai ditar a tática será o contexto prático. Esse contexto também é objeto de conhecimento do Direito, que é uma das formas de controle social. Percebe-se, portanto, que há uma estrita ligação do mundo prático com o universo jurídico, embora cada um com a sua finalidade específica. Vejamos como isso funciona.
3. Delimitação do sistema jurídico
Os sistemas de controle social permitem a convivência coletiva, por meio da fixação de normas de conduta para vários setores e atividades da vida humana. Ao lado da moral, da religião, da ética e das convenções sociais, dos usos e costumes, o Direito é um dos sistemas mais característicos e aptos a esse fim.
Dentre as diversas concepções da Ciência do Direito, que refoge discutir aprofundadamente neste artigo, apresenta-se como destaque a “teoria tridimensional”, que engloba seus elementos essenciais: fato, valor e norma jurídica. Significa que o Direito é a integração normativa dos fatos da vida e dos valores que a eles são atribuídos, formando um sistema.
As normas jurídicas emitem comandos que podem ser traduzidos em proibições, permissões e obrigações. Portanto, diante dessas normas, o cidadão não deverá realizar as condutas proibidas, poderá realizar as condutar permitidas ou não vedadas, e fica obrigado a cumprir determinadas imposições normativas.
A grande diferença das outras formas de controle social está na coercitividade do Direito. Quando esses comandos provenientes das normas jurídicas são violados, surge a previsão de uma sanção pelo seu descumprimento ou para obrigar o recalcitrante a cumpri-los, ou ainda a desconstituição de atos ou situações jurídicas, por meio de medidas aplicadas por autoridades do Estado.
As sanções ou consequências respectivas têm grande variação, a depender do campo de regulação do Direito e da sua natureza. Em regra, o Direito pode gerar responsabilização ou medidas de natureza civil, penal ou administrativa, ou ainda providências administrativas e judiciais específicas para constituir ou desconstituir certas situações, após um procedimento legal de apuração das condutas.
Assim, diante da prática de fatos definidos como crime, haverá responsabilização jurídica, com previsão de aplicação de pena. Já a responsabilização civil ocorre se o fato é considerado ilícito, gerando o dever de indenizar. No campo do Direito administrativo, o descumprimento de normas pode levar à aplicação de sanções de polícia administrativa ou, para alguns agentes públicos, a aplicação de sanção disciplinar. Pode, ainda, ocorrer a anulação, revogação ou cassação de atos administrativos.
Ao passo que as armas de fogo podem ser utilizadas como instrumentos de ataque ou de defesa, o universo jurídico-normativo se destina a limitar ações nocivas ou excessivas, congregar interesses, valores e direitos, para permitir o uso desses artefatos e promover a durabilidade do tecido social.
A par de tudo que foi visto, torna-se fácil perceber que o contexto prático ou real que fomenta as ações táticas será o mesmo contexto de onde se extrai a consequência jurídica. Logo, a tática e o Direito são “faces da mesma moeda”, retirados daquilo que chamamos de “contexto circunstancial”. A diferença básica é que a finalidade do sistema tático é obter uma situação física e psíquica vantajosa, e a finalidade do sistema jurídico é obter uma conduta lícita.
A partir da integração dos seus elementos essenciais (fato, valor e norma jurídica),pode-se sintetizar que o Direito fará a integração normativa dos fatos táticos, dando-lhes significação por meio dos valores. A conduta tática não pode dispensar a observância das normas jurídicas, tampouco a definição jurídica do caso concreto pode deixar de levar em conta os fatores circunstanciais que motivaram o operador de armas a agir de tal e qual modo.
Com a devida noção da importância e da amplitude das normas jurídicas, e de sua aplicação às questões práticas da vida social, passemos agora à sua especificação em um contexto tático de autoproteção armada.
4. Aplicação das normas jurídicas: o elemento “prevenção” no contexto da autoproteção armada
À luz do Direito, será analisado nesta parte apenas o elemento “prevenção” que compõe o sistema tático de preservação da vida e da integridade pessoal por meio de armas de fogo.
Como já abordado anteriormente, a prevenção é a evitação da situação de confronto por meio de medidas ativas e passivas que impedem a colocação do agente na cena da ocorrência. Neste sentido, torna-se um dos elementos mais importantes do sistema de autoproteção, já que se destina a evitar o próprio confronto armado. As condutas preventivas têm muito mais relevância tática do que relevância propriamente jurídica, vez que não são pautadas pelo uso direto da arma de fogo, mas por ações que evitam a inserção do agente em situação de necessária reação pelas armas.
Em regra, não existirá uma ameaça concreta, um risco efetivo ou agressão em curso quando forem cabíveis as medidas de prevenção, o que torna seu estudo jurídico um pouco distante dos conceitos de legítima defesa. Mas é importante destacar que a prevenção revela a postura de evitação ao conflito e denota logicamente a ideia de boa-fé, situações muito úteis para evitar responsabilização jurídica. Cabe ressaltar que muitas vezes a prevenção não surte o efeito desejado e, diante do inevitável combate, haverá uma investigação de todas as ações que o antecederam, incluindo as medidas adotadas por quem fez uso reativo do armamento. Nessas hipóteses, o que parecia ser irrelevante inicialmente passa a ter grande importância no contexto probatório, capaz de definir os sinais ou indícios da intenção de quem age a título de defesa pessoal, se o fez por real intuito defensivo ou se por mero espírito emulatório e agressivo.
A evitação do combate pode ter significância jurídica direta nos casos em que o seu exercício se adequar às normas de conduta reguladas pelo Direito, como por exemplo, o próprio direito do cidadão ao porte regular de armas, na forma prevista em lei, e as ações policiais preventivas de patrulhamento e porte ostensivo de armas. Nesse casos, por serem ações regulamentadas, estarão na esfera da licitude se exercidas sem abuso ou excesso.
Atente-se que a questão do porte de armas tem uma observação acerca da ostensividade. Para o cidadão comum, o simples porte velado é uma medida de natural cunho preventivo, que deve se aliar a outras medidas de autoproteção. Não lhe é dado o direito ao porte ostensivo, que poderá configurar infração administrativa ou até mesmo penal, a depender da forma empregada. O porte ostensivo autorizado, por outro lado, que mais se aplica ao caso dos agentes de segurança pública ou privada, pode ser considerado um clássico elemento de “prevenção”, já que a arma tenciona obter a eficácia dissuasória.
Destaque-se que a aquisição de armas pelos cidadãos, para posse residencial e empresarial, também é uma ação preventiva em sentido amplo, mas a sua abordagem é muito mais de cunho político e de ordem difusa, envolvendo direitos individuais e coletivos em escala ampla, forte na temática da segurança pública. Logo, pela sua finalidade estratégica, não se liga propriamente ao enfoque aqui abordado sobre o sistema tático de autoproteção, o qual pressupõe uma intrínseca relação com uma potencial agressão, em contexto prático e de risco concreto.
Como exemplos mais comuns de ações preventivas, pode-se citar medidas aplicáveis até mesmo para quem não porta uma arma de fogo: adotar atenção redobrada nos ambientes e deslocamentos, alternar vias de deslocamento pessoal, trancar residências e instalações físicas, colocar sistemas de vigilância ou de proteção, blindar veículos, posicionar-se adequada e atentamente no trânsito etc. São todas medidas que dificilmente provocarão atos ilícitos pela sua adoção, quando praticadas de forma normal e regular.
Por outro lado, mesmo sem o emprego direto de armas de fogo, se as ações preventivas de algum modo violarem as regras jurídicas se transformarão em atos ilícitos, com consequências civis e penais, além de consequências administrativas.
A instalação prévia de ofendículos (aparatos visíveis e preordenados para defesa), ou de instrumentos de proteção patrimonial, como cercas elétricas, cacos de vidro nos muros, concertinas, lanças fixadas nos portões, cães de guarda, são algumas medidas que mais têm despertado questões jurídicas, já que a inadequada aplicação, o uso indevido ou excessivo, poderão tornar o ato preventivo ilícito, desde que disponha de potencialidade para violar direitos, tais como a vida e a saúde de terceiros que não estejam na posição de agressores.
Com o avanço tecnológico, várias outras ações preventivas têm sido implementadas de forma prévia e estática, tais como a instalação de câmeras de vigilância para gravação de imagens, drones, sistemas de alarmes, botão do pânico etc. Da mesma forma, referido uso dos recursos tecnológicos deve ocorrer dentro da legalidade, sem violar a intimidade e a privacidade de terceiros que não se coloquem na posição de agressão.
Por fim, é possível que devido ao erro de percepção, erro de execução de uma medida, ou à exaltação de ânimos, em face de situações mais complexas e de grande tensão, aquele que se protege tome posturas preventivas mais incisivas ou desproporcionais, visando evitar o emprego da arma de fogo, como, por exemplo, adentrar em uma residência sem autorização ou cruzar uma via pública em desconformidade com as regras de trânsito. Nesses casos, existem previsões legais que podem eventualmente isentar ou diminuir a responsabilização jurídica do indivíduo, se confirmadas as circunstâncias excepcionais que levaram ao erro ou ao ímpeto, mas que dependem da interpretação das provas que forem submetidas ao procedimento de apuração, para decisão pela autoridade judicial ou administrativa, conforme o caso.
5. Considerações finais da primeira parte
Esta primeira parte do artigo (trilogia) apresentou as delimitações conceituais, as distinções necessárias e a correlação entre os sistemas tático e jurídico, e em seguida enfocou apenas um dos elementos do sistema (tático) de autoproteção armada: a prevenção ou as medidas preventivas.
Por ser o elemento mais brando, o que se deseja pela medida preventiva é sempre evitar ou diminuir o risco, o perigo ou a possibilidade de que uma situação de agressão venha ocorrer, enquanto essa hipótese for meramente potencial. Com isso, também se diminui a possibilidade de uso da própria arma de fogo. Assim, as medidas preventivas adotadas só ganharão relevância jurídica específica se violarem normas de Direito, passíveis de responsabilização nas esferas penal, civil e administrativa.
Na segunda e próxima parte deste artigo, trataremos dos elementos “fuga” e “não reação”, momento que já existe uma agressão em curso ou um risco de agressão, mas que por opção do operador de armas não leva às medidas de confrontação.
Por fim, abordaremos na terceira parte os 2(dois) últimos elementos do sistema, que são a negociação e a reação armada propriamente dita, bem como seus desdobramentos jurídicos, oportunidade em que serão discutidas as medidas precedentes ou realizadas durante um confronto armado.
Esperaremos o nobre leitor por lá…
Força e honra!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. Vol. 1. 13ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen júris, 2005.
1 Apesar dessa constatação, o termo “defesa pessoal” é o mais comumente utilizado na literatura, inclusive pela legislação, a exemplo do art. 20 do Decreto Nº 9.847, de 2019.
2 Pelo dicionário, “sistema” pode significar “Reunião dos elementos que, concretos ou abstratos, se interligam de modo a formar um todo organizado” ou “Reunião dos preceitos que, sistematicamente relacionados, são aplicados numa área determinada; teoria ou doutrina”. SISTEMA. In: SISTEMA, Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus, 2022. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/tatica/>. Acesso em: 23/03/2022.
3 A extensão do conceito para a defesa de terceiros ou da coletividade decorre de um princípio básico de convivência social, que é o dever de solidariedade constitucionalmente previsto no art. 3º, I, da Constituição Federal de 1988 (CF 88). Além disso, no seu art. 144, a CF 88 também diz que a segurança pública é responsabilidade de todos. Nas leis infraconstitucionais existem inúmeras situações que privilegiam esse dever de solidariedade, por meio de regras nas esferas penal, processual, previdenciária, civil, familiar, administrativas etc.
4 “Arte de combinar a ação de tropas, ou os recursos característicos das diferentes armas, a fim de obter o máximo de eficácia no combate: tática de infantaria; tática naval; tática aérea.” ou “Conjunto de meios ou recursos empregados para alcançar um resultado favorável”. TÁTICA. In: TÁTICA, Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus, 2022. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/tatica/>. Acesso em: 23/03/2022.
5 VASCONCELOS, Cleidson José Rocha. Armas de fogo e autoproteção. Porto Alegre: Alcance, 2015. p. 185-186
6 Ver também, do mesmo autor, artigo no portal infoarmas: https://infoarmas.com.br/sap-sistema-de-autoprotecao/
7 Referidos elementos não são mutuamente excludentes e podem ocorrer de forma simultânea, isolada, alternada ou sucessiva, considerando parte ou todo o contexto da ação. Por exemplo, pode haver uma prevenção, que não surtiu efeito, seguida ou não de negociação, que pode resultar em inércia ou reação.
8 A “teoria tridimensional” (ou “tridimensionalismo jurídico”) foi formulada pelo professor Miguel Reale. Cf. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1991
9 Cf. REALE, Miguel. Op. cit., p. 65: “a) onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e necessariamente, um fato subjacente (fato econômico, geográfico, demográfico, de ordem técnica etc.); um valor, que confere determinada significação a esse fato, inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato ao valor; b) tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados um dos outros, mas coexistem numa unidade concreta; c) mais ainda, esses elementos ou fatores não só se exigem reciprocamente, mas atuam como elos de um processo (… o Direito é uma realidade histórico-cultural), de tal modo que a vida do Direito resulta da interação dinâmica e dialética dos três elementos que a interagem”.
10 Polícia administrativa é a atividade do Estado que disciplina ou limita o exercício da autonomia privada em prol do bem coletivo, impondo restrições e condicionamentos à liberdade, a direitos e interesses. Existe conceituação legal no art. 78 do Código Tributário Nacional, quando define o Poder de Polícia: “Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.”
11 O porte de armas deve ocorrer de forma velada, em regra, conforme Decreto 9.847/2019. “Art. 20. O titular de porte de arma de fogo para defesa pessoal concedido nos termos do disposto no art. 10 da Lei nº 10.826, de 2003, não poderá conduzi-la ostensivamente ou com ela adentrar ou permanecer em locais públicos, tais como igrejas, escolas, estádios desportivos, clubes, agências bancárias ou outros locais onde haja aglomeração de pessoas em decorrência de eventos de qualquer natureza. § 1º A inobservância ao disposto neste artigo implicará na cassação do porte de arma de fogo e na apreensão da arma, pela autoridade competente, que adotará as medidas legais pertinentes.” “Art. 26. Os órgãos, as instituições e as corporações a que se referem os incisos I, II, III, V, VI, VII e X do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 2003, estabelecerão, em normas próprias, os procedimentos relativos às condições para a utilização das armas de fogo de sua propriedade, ainda que fora de serviço. § 5º O porte de que tratam os incisos V, VI e X do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 2003, e aquele previsto em lei própria, na forma prevista no caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 2003, serão concedidos, exclusivamente, para defesa pessoal, hipótese em que será vedado aos seus titulares o porte ostensivo da arma de fogo.”
12 Uma infração penal pode ocorrer, por exemplo, quando a ostensividade do porte de armas configurar uma conduta de ameaça, prevista no art. 147 do Código Penal. Nesse caso, a conduta indicará um gesto ou meio de simbólico de causar mal injusto e grave a determinada pessoa.
13 Código Civil, Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
14 Os crimes podem ser dolosos, quando o agente tem consciência e vontade de praticar o ilícito penal, ou culposos, quando o agente quebra o dever objetivo de cuidado, dando causa a um resultado danoso, que não pretendia causar.
15 São consequências administrativas as denominadas “sanções de polícia administrativa”, como multas, embargos, retenções, cassações etc. Além disso, existem punições para agentes públicos, civis ou militares.
16 A proteção patrimonial também é protegida pela lei civil quando trata do limite dos prédios e do direito de tapagem. Código Civil, Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas.
17 As principais discussões sobre os ofendículos giram em torno da sua natureza penal, se exercício regular do direito ou legítima defesa preordenada, além das questões práticas acerca da não configuração de uma excludente de ilicitude ou do excesso no seu uso.
18 O Direito penal prevê hipóteses de isenção ou de diminuição de responsabilização, como é o caso do “erro de tipo”, se ficar comprovado que o agente avaliou mal uma situação de forma inevitável, e cometeu o fato por engano sobre a realidade. No caso de exaltação de ânimos, ainda, é possível considerar que o agente não dispunha de culpabilidade, vez que não poderia ter agido de outro modo. Também é possível responsabilizar o agente apenas por crimes culposos, em detrimento da configuração de crimes dolosos, quando uma ação descuidada gerar um resultado criminoso, mas ficar demonstrado que não havia intenção da sua prática. Na esferas civil e administrativa, as circunstâncias do fato também podem interferir no grau de responsabilização ou na decisão administrativa.