Qualquer cenário de crise evidencia as fragilidades dos sistemas que atinge e da sociedade como um todo. A crise imposta pela pandemia de coronavírus não é diferente, senão em intensidade. Na medida em que, direta ou indiretamente, atinge a todos, expõe rachaduras no tecido social e nas estruturas por ele sustentadas.
Mas o que isso tem a ver com a segurança pública? Bem, guardadas as devidas proporções, os problemas que, atualmente, estão sendo administrados por profissionais da saúde, gestores e por todas as pessoas impactadas oferecem um panorama semelhante àquele enfrentado há anos na segurança pública. A diferença de intensidade – ou melhor, de dose -, no entanto, sempre os camuflou, amenizando revolta e engajamento da sociedade.
Como é fundamental extrair lições de cada crise, o coronavírus pode nos abrir os olhos para um panorama de desestrutura mais amplo e nos compelir a agir para promover mudanças estruturais importantes nas mais diversas áreas. Mas, para tanto, é necessário expor nossas fragilidades, enquanto sociedade
PADRÕES SOCIOCULTURAIS
Individualismo, ignorância e indisciplina
É evidente que a sociedade vive uma crise de paradigmas. Grandes estruturas que, antes, conduziam ao desenvolvimento de uma ética coletiva mais ampla, como família, religião, nacionalidade e ideologias, por exemplo, se encontram, cada vez mais, enfraquecidas. Experimentamos, portanto, uma pulverização de referenciais, isto é, não havendo entes centralizados aptos a conduzirem a ordenação social, o indivíduo, suas opiniões e escolhas ganham imensa relevância, muitas vezes, se sobrepondo ao bem comum.
Este afastamento de um senso coletivo mais amplo faz com que pessoas busquem, quase que exclusivamente, a satisfação de interesses pessoais ou de grupos cada vez mais restritos e pulverizados. “Eu”, “meu”, direita, esquerda, movimentos indigenista, negro, branco, LGBTQ+, feminismo, grupo político A, B ou C. A vida passou a ser vista, prioritariamente, como um projeto individual. Assim, pessoas tendem a agir de forma desconectada da coletividade e, muitas vezes, inconsequente e irresponsavelmente.
Opiniões, vontades e direitos são o centro das decisões e ações. Impera um espírito de contestação e rebeldia destrutivo e contraproducente. O senso coletivo se enfraquece. Obviamente, isto gera repercussões gravíssimas, especialmente em momentos de crise.

Em relação ao coronavírus, isto se mostra nos inúmeros casos em que diretrizes para controle de disseminação da doença são bombardeadas e simplesmente desconsideradas por diversas pessoas, de acordo com convicções e vontades.
Impera uma noção de que “se isso não me atinge, eu não me importo, tampouco me sinto obrigado a zelar pelos demais”.

E vai além, há casos de contaminados ou em situação suspeita que, simplesmente, se recusam a adotar medidas de segurança e, deliberadamente, expõem demais pessoas a riscos.
No âmbito da segurança pública, esta falta de compromisso com o bem estar e segurança de terceiros sempre foi experimentada intensamente. Profissionais que lidam com o público diariamente, percebem a prevalência da total falta de respeito por regras sociais. Ao que parece, a grande marca da sociedade moderna é, justamente, uma visão egoísta de mundo em que vontades individuais devem sempre prevalecer, não importando suas repercussões.
E não apenas isto, há uma total contestação às autoridades que se encontram na ponta da lança. Policiais, comumente, se deparam com situações de resistência e desobediência a ordens legais, sob xingamentos e jargões como “é meu direito”, “isto é abuso”, etc. Em resumo, tudo aquilo que colide com vontades individuais tende a ser atacado.
Obviamente, o extremo individualismo imperante dificulta, em qualquer situação, a adoção de medidas visando o bem comum.
A este panorama se soma o peso da ignorância e da ausência de interesse e oportunidades no sentido da busca pelo conhecimento, fatores vangloriados, inclusive, por ex-líderes nacionais de vulto. Na medida em que a população não busca – tampouco recebe, por parte do Estado – dados e informações fidedignas sobre as crises que vivencia e, quando o faz, tende a permanecer na superficialidade, há, tanto em relação à segurança, como saúde, uma inocente mentalidade de “não vai dar nada”, “não vai me atingir”.
Há uma verdadeira blindagem psicológica, que impede que se enxergue a magnitude dos problemas. E disso decorre a falta de planejamento, inação ou a ação displicente, seja no plano individual, seja no coletivo.
Há indivíduos que, simplesmente, negam os problemas existentes, levando suas vidas normalmente e incentivando os demais a agirem da mesma forma, sem precauções. E há aqueles que, por não perceberem a gravidade dos problemas que os cercam, adaptam condutas “para inglês ver”.
Policiais, diariamente, se presenciam e instruem pessoas desatentas transitando com o celular nas mãos em ruas movimentadas, não é verdade? Incontáveis são os indivíduos que dirigem em alta velocidade e perigosamente, somente freando diante de um radar eletrônico. Outros tantos somente colocam cinto de segurança quando se deparam com policiais. Ainda exemplificativamente e tratando da crise de saúde, se tornou comum, em locais onde o uso de máscaras é obrigatório, ver pessoas deixando de usá-las ou as retirando quando falam com terceiros.
Estas 3 características da sociedade, portanto, individualismo, ignorância e indisciplina, alimentam crises nas mais variadas esferas.
Glamourização de equívocos e a desigualdade escancarada
Outro aspecto relevante a ser observado, com repercussões gravíssimas em períodos de instabilidade, é a glamourização dos equívocos e, obviamente, as intensas desigualdades sociais. Diariamente, somos bombardeados com referenciais vazios e inoportunos, bem como com a normalização de absurdos.
Como forma de empoderar pessoas submetidas a condições desumanizadoras, como as encontradas nas estruturas de favela e nas periferias, adotou-se a estratégia de disseminar a normalidade de meios desestruturados. Ao invés do planejamento e execução de medidas aptas a retirarem pessoas de ambientes insalubres e inadequados ou, ao menos, de transformá-los, vangloriam-se os locais e as práticas que se mostram prejudiciais para a sociedade. Espalha-se a ideia da “cria de favela” como cultura fechada, em oposição a uma necessária visão de união e mudança. Compartimenta-se a pobreza – assim como a riqueza, em outro extremo -, para que ela, voluntariamente, se condicione, conforme e sinta orgulho de viver em ambientes que, do ponto de vista civilizatório, simplesmente não deveriam existir. Como parte desta receita, vemos surgir uma intensa contestação e desaprovação em relação a qualquer ação do Estado, que deveria centralizar medidas de transformação social.
Estado visto como oponente e referenciais comunitários equivocados à frente, passamos a observar outro fenômeno nefasto, que é o igual e paralelo endeusamento de indivíduos desconectados da realidade. A redoma, isto é, aquele estrato social mais abastado e com visibilidade e influência, que vive em uma bolha de proteção e ignorância em relação à dura realidade existente no país, também é alçada ao status de referência. Ocorre que, como regra, estes referenciais se movem de acordo com a lógica do individualismo, reverberando somente aquilo que seja interessante a seus objetivos pessoais, mesmo havendo uma imensa distância entre o que pregam e suas ações.
A consequência das disparidades entre os estratos sociais e da glamourização de equívocos conseguem entorpecer a sociedade intensamente. De um lado, a camada mais pobre, acostumada com o total abandono e crises diariamente vivenciadas, passa a achar natural o caos, se torna resiliente e, muitas vezes, resistente a intervenções do próprio Estado. Afinal, ela já está acostumada com hospitais lotados e violência. Por outro, camadas mais ricas e com maior visibilidade desenvolvem uma visão irreal da vida, fechando os olhos para o sofrimento de relevante parcela da população e, baseadas nesta noção de mundo equivocada, sugerindo soluções que não se sustentam.

E qual o resultado desta fórmula? É algo que já é de amplo conhecimento, seja na área de segurança, seja na de saúde: No agravamento das crises, há a tendência de que o topo da pirâmide se salve…

…e a base seja abandonada à própria sorte.
O INIMIGO DESCONHECIDO
Quanto aos inimigos, sociedade e Estado realmente se dedicam a conhecê-los? Seja na saúde, seja na segurança, há uma abstenção de se entender ameaças que batem às portas. Como regra, deixam-se de produzir estatísticas e estudos relevantes e confiáveis, ou seja, sem vieses que busquem confirmar conceitos preestabelecidos. Não se estuda, não se prospectam cenários, o que compromete o processo decisório. Ciência, realmente, não é prioridade.
Esta tendência de cegueira e inação se mantém mesmo quando o combate ainda não está sendo travado, isto é, quando as ameaças ainda estão em um horizonte mais distante, mostrando sua potencialidade danosa.

E quando abnegados e dedicados profissionais se dedicam a apontar para os perigos e decifrar suas características, suas conclusões, muitas vezes, são subestimadas ou preteridas frente a convicções e vontades pessoais. Assim, as lutas são travadas, literalmente, às cegas, com esforços – e sacrifícios – individuais e de pequenos grupos.
AS DIFICULDADES ESTRUTURAIS
A expressão “colapso do sistema” se tornou comum nos jornais e noticiários, como se dito colapso fosse oriundo da disseminação do vírus. Ocorre que, tal como se dá no universo da segurança pública, o colapso já existia ou era latente. A ausência de planejamento estratégico seriamente elaborado e executado, a total escassez de investimentos em meios e nos elementos humanos, seja no sistema de saúde seja nas instituições policiais, já expunha o sistema ao caos.
O coronavírus veio para evidenciar, isto é, trazer às vistas de todos aqueles que viviam em negação, não se importavam ou se aproveitavam da situação, os problemas estruturais já amplamente conhecidos e experimentados por aqueles que atuavam na linha de frente. A consequência óbvia disto é que, com o surgimento de qualquer crise mais aguda que seja, ocorre rápido exaurimento das estruturas e profissionais.
E o cenário se agrava, na medida em que é praticamente impossível resolver todos os problemas de um sistema em pane de forma imediata. Assiste-se, então, na saúde pública, uma dificuldade de aquisição emergencial de respiradores, máscaras e outros EPIs, bem como de disponibilização de profissionais para atuarem emergencialmente. E na segurança pública? Bem, os problemas de falta de equipamentos adequados, a existência de frotas obsoletas e defasagem de quadros seguem a mesma lógica, desde sempre.
AS INCONGRUÊNCIAS NORMATIVAS
A prevalência do individualismo já tratado, tratada anteriormente, repercute no âmbito normativo no sentido de amenizar a responsabilização por atos socialmente inaceitáveis e dificultar o enforcement, isto é, a aplicação dos já fragilizados mecanismos colocados à disposição daqueles responsáveis pela fiscalização e aplicação da lei.
Da mesma forma que infratores acabam sendo beneficiados por um sistema leniente, encontram-se barreiras e incongruências imensas no que diz respeito à imposição de medidas sanitárias, atualmente. Como obrigar alguém a usar máscaras? Como restringir a circulação de pessoas? Como impor um distanciamento social? Quais os mecanismos, em um universo absolutamente garantista e carente de referenciais éticos, capazes de amparar a exigência de tais medidas?
Não há dúvidas de que a resposta a essas perguntas é desconhecida, havendo um amplo rol de medidas sendo adotados por Estados e Municípios, muitas delas fortemente contestadas institucionalmente e, também, pelos cidadãos.
Em suma, não há um sistema normativo rígido o suficiente para garantir ordem e segurança públicas e, em meio à crise atual, segurança sanitária.
Além disso, o fraco normativo existente está imerso em contrariedade. De um lado, temos instituições públicas e privadas pregando, por exemplo, a libertação de criminosos do cárcere, sob o argumento de que o Estado deve zelar pela integridade de detentos e que cadeias seriam verdadeiras “bombas biológicas”.
As consequências de tais medidas são óbvias, com muitos apenados aproveitando a oportunidade para se evadirem do controle estatal.

No outro, o mesmo Estado, ao restringir a circulação de cidadãos, como meio de controle da pandemia, os ameaça de sanções de natureza penal. Ou seja, o sistema legal atual não apenas carece de rigidez, como de clareza e coerência.
OS ESPECIALISTAS E AS SOLUÇÕES
Outro fator que a crise evidencia é a tendência de, frente a grandes desafios de difícil solução, inúmeras vozes dissonantes se apresentarem, por exemplo, com previsões de “pico de contaminação” e com modelos a serem seguidos para contenção da doença. Diversos são os estudos favoráveis e contrários ao uso deste ou daquele medicamento. Cenários positivos ou de caos total surgem aos montes, diariamente. A própria comunidade científica se apega, quase que em uma espécie de “fixação tática”, às mais diversas convicções disseminadas. Quem está certo? Quem está errado? Bem, é difícil dizer em meio a uma realidade nunca experimentada e de total incerteza.
Alguma semelhança com a segurança pública? Quantos especialistas, em seus laboratórios, ou melhor, escritórios, apresentam uma profusão de críticas e soluções em relação à atividade policial e políticas – se é que podem ser chamadas assim – públicas? Considerável parte deles, com ampla visibilidade em meios de comunicação, nunca enfrentou realmente uma crise de segurança pública, tampouco tem experiência na linha de frente da atividade policial. Qual a voz a ser ouvida? É tão simples assim apontar rumos a serem seguidos? Obviamente que não. Debates complexos não podem se restringir a inflexibilidades, superficialidades ou emoções, seja em meio a uma pandemia, seja em meio ao caos na segurança pública.
Notável, também, no que diz respeito a soluções e teorias é algo resumido perfeitamente por Von Moltke, com a seguinte afirmação:
“Nenhum plano de batalha sobrevive ao contato com o inimigo”.
Na crise atual, caminhos como “fique em casa”, quando rigorosamente tentados na prática, se mostram praticamente inviáveis. Em uma realidade brasileira, como fazer com que as pessoas, efetivamente, fiquem em casa? Como exigir que um morador de periferia, sem o mínimo de estrutura, permaneça isolado? Como exigir de um povo que, como regra, não possui reserva financeira para sustentar um mês que seja de instabilidade, fique sem trabalhar? Com auxílio de R$600,00 (seiscentos reais), que, nas grandes capitais não pagam nem o valor de um aluguel?
No campo do desenvolvimento de medicações, vemos outro exemplo latente: quantas substâncias já foram noticiadas como capazes de neutralizarem o vírus em laboratório e, uma vez envolvidas em testes com animais e humanos, se mostraram ineficazes? Inúmeras.
No âmbito da segurança pública, vários dilemas seguem estas mesmas linhas. Apesar dos diversos estudiosos contrários a políticas de enfrentamento, como garantir a presença policial em comunidades carentes sem enfrentamento com criminosos, que, nestas áreas se homiziam, por exemplo?
Ou seja, é evidente que o universo da teoria tende a apresentar, em não raras oportunidades, rumos e soluções simples e superficiais, que, em considerável parte das vezes, não se sustentam diante das demandas da realidade. Como consequência deste imbróglio de teorias e opiniões, as vozes daqueles que estão na linha de frente (profissionais de saúde e segurança pública), acabam efetivamente silenciadas e o apoio concreto relegado a outro plano de prioridades.
POLÍTICOS E GESTORES
Diante de todas as dificuldades enfrentadas em uma crise de alta complexidade, líderes políticos e gestores assumem papel crucial na apresentação de soluções e restabelecimento da normalidade. No entanto, geralmente, no Brasil, o que se verifica é uma verdadeira autofagia no topo da pirâmide do poder, isto é, lideranças reduzem seus papéis a uma incessante luta de versões. Assim, os inúmeros problemas que se acumulam não são atacados e o enfrentamento se perde diante da briga pelo poder.
Há, também, uma carência de líderes com serenidade, capacidades apaziguadora e de união, bem como pulso para guiarem a sociedade por caminhos adequados. A fragmentação do corpo social se torna evidente, em meio a guerra de narrativas. Neste cenário, se torna comum o surgimento de nomes, aqui e ali, que são adotados por indivíduos como salvadores. Há a multiplicação de “autoridades” em uma escala tão intensa, que cada uma delas, em verdade, acaba por perder, justamente, sua capacidade de nortear a sociedade. Em suma, como destaca Zygmunt Bauman:
“Quando as autoridades são muitas, tendem a cancelar-se mutuamente, e a única autoridade efetiva na área é a que pode escolher entre elas. […] As autoridades não mais ordenam; elas se tornam agradáveis a quem escolhe; tentam e seduzem”.
A falta de unicidade de discursos e de rumos pacificados pelas lideranças cria um ambiente de ainda maior instabilidade no enfrentamento das crises, sejam elas de saúde, sejam de segurança. O que ocorre, ao fim, é a verificação de inúmeras políticas diferentes e conflitantes entre si sendo aplicadas de forma descoordenada e sem foco. De um lado, ocupação permanente de áreas carentes, do outro, política de enfrentamento. De um lado, isolamento social e, do outro, retomada geral das atividades.
Qual política cada cidadão deverá seguir e obedecer? Bem, em meio à incerteza, cada um acaba por seguir – e se apegar – àquilo que ditam suas convicções pessoais. E esta opção retroalimenta este sistema de conflitos, pois, uma vez que as lideranças identificam os grupos aos quais devem lealdade, elas, simplesmente, como afirmou Bauman, alinham seu discurso a eles. Não são incomuns, desta forma, a apresentação e defesa intransigente de fórmulas milagrosas, para agradar convicções de grupos específicos, sem que haja outras medidas contundentes de suporte. Medicações contestadas sendo apresentadas como salvação, UPPs (Governo de Sérgio Cabral, no Rio de Janeiro) e suspensão de ações policiais em favelas (Governo de Leonel Brizola, no Rio de Janeiro), são exemplos disso.
Em suma, o que temos, ao fim das contas, é a total ausência de líderes equilibrados guiando pelo exemplo!

PARASITAS E CRIMINOSOS EM MEIO A CRISES
Criminosos e parasitas são especialistas em identificarem fragilidades institucionais e oportunidades. O caos político e de gestão abre um espaço ainda maior para a atuação de grupos e pessoas que operam às margens da lei e/ou da ética. Já no início da pandemia, presenciamos comerciantes precificando seus produtos abusivamente. Problemas éticos logo evoluíram para ilegalidades, com irregularidades na aquisição de insumos e equipamentos médicos por gestores. No que diz respeito a auxílios governamentais, desencadeou-se uma enxurrada de fraudes e golpes.
Por outro lado, o crime organizado violento, ciente das fragilidades sistêmicas e experimentando uma crise própria, intensificou suas ações, agindo com imensa agressividade em alguns casos e adaptando suas práticas em outros.

Igualmente grave é observar suas ações frente ao colapso do Estado como ente capaz de apresentar alternativas. Diante da incapacidade institucional de atuar efetivamente, especialmente em áreas carentes, o crime organizado passa a agir, intensamente, como ente regulador.

Neste contexto, o próprio Estado, reconhecendo sua incapacidade, transfere poderes e responsabilidades para grupos antagonistas, enfraquecendo a si mesmo.

LINHA DE FRENTE
Todo o exposto repercute direta e pesadamente sobre o foco do confronto, que é a linha de frente. Como dito, é quase impossível resolver todos os problemas estruturais em meio à crise. Há, isso sim, um agravamento, na medida em que Estado e sociedade se perdem em disputas e insolucionáveis questões internas. Assim, a falta de um norte apto a trazer paliativos, permite que sejam deixados à própria sorte aqueles que estão atuando, efetivamente, no combate à crise que se apresenta.
Profissionais da saúde, assim como policiais, percebem com maior intensidade, em momentos assim, os reflexos da falta de estrutura e suporte por parte do Estado e da sociedade, da falta de equipamentos e do estresse prolongado.
O peso das cobranças tende a se intensificar, acompanhado, muitas vezes, de incompreensão e repulsa por parcela da sociedade.

Naturalmente, toda a pressão e esgotamento psicológico potencializarão a possibilidade de erros, o que, em um cenário catastrófico, é virtualmente impossível de impedir.

Alguns sucumbirão à fadiga e desgastes físicos e psicológicos. Alguns farão o mais alto sacrifício em nome da população e no exercício de seus ofícios.

Ainda assim, a maioria permanecerá lutando, em respeito a suas próprias convicções e ao juramento que fizeram, sempre amparados pela crença em dias melhores.
Força e fé para quem está na luta.
Consciência e autorreflexão para a sociedade.
Que aprendamos a enfrentar e sair das crises cotidianas fortalecidos.