O lançamento, na semana passada, da versão em .300 BLK da carabina T-4 da Taurus causou um certo frenezi no mundo do tiro, com muitos atiradores prontos para abandonar os seus “antigos” 5,56 x 45 mm em prol do novo calibre. Mas, será que ele é isso tudo mesmo?
Para quem ainda não se debruçou sobre e o .300 BLK, vai um pequeno resumo: o calibre é relativamente recente (normatizado pela SAAMI em 2011) e foi baseado no .300 Whisper. Como o head (parte inferior) do estojo tem as mesmas dimensões que o 5,56 x 45 mm, ambos tem o benefício de empregar o mesmo BCG (bolt carrier group– transportador do ferrolho) e carregadores, o que se traduz numa grande vantagem logística.
Logicamente, o cano deve ser trocado para empregar o .300 BLK, que tem diâmetro de .30 (7,62 mm), ao invés de 5,56 mm. Aliás, o .300 BLK pode também ser denominado de 7,62 x 35 mm, mais um membro da conhecida família .30 ao lado de outros bem conhecidos como o 7,62 x 39 mm e 7,62 x 51 mm.
Inclusive já estão disponíveis no mercado mundial algumas plataformas modulares, que permitem a troca rápida de cano pelo próprio operador, ampliando seu leque de opções táticas. Em poucos segundos é possível alterar o calibre do armamento do 5,56 x 45 mm para o .300 BLK apenas com a mudança do cano. Ainda, mesmo que a arma não tenha essa capacidade, o operador pode trocar o upper receiver e utilizar o mesmo lower, pois são rigorosamente iguais para ambos os calibres.
Cabe aqui um importante ALERTA: se você adquirir uma arma em .300 BLK, muito cuidado para não confundir os carregadores e acabar disparando um cartucho de uma arma configurada para 5,56 x 45 mm. Os resultados são catastróficos, com a “explosão” do armamento, colocando inclusive o atirador em risco.
Voltando ao .300 BLK, parece evidente que a ideia da Advanced Armament Company (que o desenvolveu junto com a Remington Defense) era criar um calibre “ocidental” que tivesse comportamento balístico próximo do 7,62 x 39 mm, do onipresente AK-47. Do ponto de vista da balística externa, o .300 BLK tem 17% mais energia que seu “primo” russo à distância de 300 m, pois esse apresenta mais arrasto aerodinâmico.
De outro lado, alguns autores defendem que o principal objetivo do desenvolvimento do .300 BLK era dar mais efetividade operacional às submetralhadoras HK MP-5 SD, que empregavam supressores de ruído, no calibre 9 x 19 mm. Fato é que, à época de sua criação, muitos imaginaram que o .300 BLK substituiria o veterano 5,56 x 45 mm como o calibre padrão das forças armadas ao redor do mundo ocidental.
Parece claro que a principal vantagem do .300 BLK, em comparação ao 5,56 x 45 mm, é que sua performance terminal não é tão dependente de altíssimas velocidades, por isso a plataforma pode ser empregada com munições subsônicas e com armas de canos curtos (ao redor de 9″), equipadas com supressores. Nessa configuração, o .300 BLK atinge todo o seu potencial, pois os estampidos disparos são de fato reduzidos drasticamente, num nível chamado de “Holywood quiet“, quase tão silencioso como vemos nos filmes! Nesse nicho específico, o .300 BLK será superior a seus pares em 5,56 x 45 mm e, logicamente, às HK MP-5 SD ou outras sumetralhadoras com supressor.
Por mais que não signifique o projétil não acelere com canos maiores, no .300 BLK essa diferença não é tão significativa quanto no 5,56 x 45 mm. Para se ter uma ideia, nos tamanhos de 4″ a 8″, o projétil ganha 50% de energia, mas de 8″ a 16″ apenas mais 20%. Esse é o motivo pelo qual muitos afirmam que 9″ seria o “tamanho ideal” para esse calibre, maximizando seus pontos positivos.
Nessa configuração temos o casamento perfeito de tamanho de cano x munição, pois os cartuchos subsônicos geralmente empregam projéteis mais pesados e possuem uma carga de pólvora já ajustada para a queima completa num cano curto. Para aplicação em situações de CQB/entradas táticas, é uma excelente opção.
Ressalte-se, contudo, que em caso de emprego de munições subsônicas, o projétil tenderá a apresentar um mecanismo de produção de lesão de baixa velocidade, pois estará voando a aproximadamente 1000 fps, com energia aproximada de 600 J. Esse patamar é cerca da metade da velocidade estipulada por Dimaio como o limite para a causação de lesões por cavidade temporária (2000 fps).
Em tiros mais longos, o .300 BLK apresentará a mesma energia à distância de 700 m que o 5,56 x 45 mm à 500 m. Contudo, pela importante queda do projétil durante a trajetória (cerca de 2,7 m à 500 m), geralmente se estipula que a distânca máxima de aplicação do calibre seja ao redor de 300 m. Dessa forma, se você quiser efetuar disparos mais longos, melhor procurar outro calibre, como o .308 Winchester ou o 6,5 mm Creedmoore.
Outro campo em que o .300 BLK claramente se destaca é na transfixação de barreiras intermediárias, especialmente por ter mais massa que o 5,56 x 45 mm. Assim, os projéteis tendem a passar mais facilmente por vidro automotivo, tábuas de madeira, árvores, roupas pesadas, chapas de metal e paredes.
A versatilidade do calibre também é um de seus pontos fortes, ainda que a oferta de munições no mercado nacional seja limitada a três opções atualmente: OTM de 115 gr, ETOG de 123 gr e subsônica ETOG de 200 gr. Nos EUA, estão disponíveis versões de 110 a 220 gr com uma ampla gama de projéteis, sejam ogivais encamisados, de ponta oca, monolíticos, com ponta de alumínio ou polimérica, dentre vários outros. Essa variedade de opções demonstra o potencial do .300 BLK para diversos empregos, como a caça, defesa residencial, tiro esportivo ou mesmo o tiro informal (plinking).
O resumo da ópera é o seguinte: o .300 BLK é sim um bom calibre, tanto para uso policial/militar quanto para o uso civil, possuindo um potencial imenso de desenvolvimento de novos projéteis e tecnologias. Contudo, como o acesso aos supressores de ruído ainda é extremamente restrito no Brasil, não temos como extrair da plataforma todo seu potencial operacional, onde de fato se destaca e se mostra definitivamente melhor que o 5,56 x 45 mm.
Também considero que existem poucos estudos de caso sobre a balística terminal do .300 BLK em confrontos armados reais, o que implica dizer que o calibre carece, de uma certa maneira, de maturidade operacional. Não custa lembrar que o 5,56 x 45 mm está em emprego militar/policial ao redor do mundo há pelo menos cinquenta anos e permanece inabalável como o calibre padrão da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Se eu teria um AR em .300 BLK? Sim, lógico, sem sombra de dúvidas! Agora, as diferenças entre os dois calibres vale o investimento na casa de R$ 16.000,00, com o milheiro da munição custando mais de 10 mil reais? Como diria Paul Harrel, you be the judge (você que decide).
Por derradeiro, diga-se de passagem que o .300 BLK falhou na missão de substituir o 5,56 x 45 mm nas forças armadas americanas, tendo em vista o anúncio recente que o US ARMY aprovou o SIG MCX, no calibre 6,8 x 51 mm, como o vencedor do programa NGSW (next generation squad weapon– arma de esquadrão de próxima geração).
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Um abraço e até a próxima!