Introdução
As posições de como atirar em uma ameaça real, é como política, não se pode discutir muito, pois cada atirador tem sua forma de atirar como um lutador tem sua forma de lutar. Já vi policiais atirando em posições ortodoxas, super bem, mantendo ali fundamentos essenciais para os aproveitamentos dos disparos. Com toda a minha sinceridade, não me considero um ótimo atirador, a todo momento tento melhorar alguns pontos, indo em cursos, escutando grandes atiradores, suas dicas e sua visão sobre o modo de atirar.
É incrível como cada um tem sua personalidade, seu traço, sua assinatura. Pois o indivíduo tem sua lucidez, entrelaçada aos pensamentos e deduções adquiridos por sua maturidade intelectual. Acho que o atirador deve preservar aquilo que se encaixa melhor no seu perfil e suas limitações. Muitos atiradores venceram seus confrontos com técnicas e táticas mais conservadoras, como também tivemos atiradores sendo mortos aplicando conceitos modernos e fazendo tudo certo.
o criminoso comum (se o tiroteio começar) vai descarregar um carregador em sua direção pra todo lado, porque não se importa com os padrões de pontaria ou danos colaterais.
Dave Spaulding
Então diante deste pensamento, da individualidade de se atirar de cada um, devemos ficar atentos ao modo como se faz e o seus resultados. Não são todas as formas que estão certas, e não podemos se apegar a nenhuma delas, pois isso nos torna preso a uma forma, e consequentemente acreditamos como verdade, sendo assim isolando qualquer outra opção exterior que não seja a que você faz.
O conhecimento é um ponto fixo no tempo, enquanto o conhecer é algo continuo.
A Origem
A posição é na verdade uma adaptação evolutiva da tão famosa técnica de tiro “Speed Rock ou Tiro de Entrevista”. Que resumidamente, é um tiro tático subconsciente em um alvo sem depender do uso da alça e massa para atirar. A ênfase é despejada no saque rápido em conjunto com golpes contundentes de distração primeiro. Em combate corpo a corpo, onde as situações de risco de vida surgem muito rápido, as técnicas mais tradicionais tornam-se arriscadas, então o atirador enfatiza um estilo menos orientado para a mira que prioriza as vantagens táticas de superioridade e supressão de tiro rápido, surpreendendo sua ameaça.
Esse e outros métodos de tiro saindo do quadril (Hip Shooting) são usados e discutidos dês do século XIX. O primeiro manual de instruções do Exército dos EUA fala sobre o uso da pistola Modelo 1911 e menciona por exemplo o Tiro Pontual , mas de forma cautelosa devido ao design.
O tiro pontual também é uma técnica usada por arqueiros e atiradores treinados para melhorar a precisão geral ao usar um arco , besta , arma de fogo ou outra arma de longo alcance . Ao desenvolver uma memória muscular para uma determinada arma, o atirador pode se acostumar com o peso e o equilíbrio da arma em sua posição de tiro típica a ponto de permanecer relativamente preciso sem precisar se concentrar na mira para mirar. Com prática sustentada, um atirador pode desenvolver uma coordenação mão-olho subconsciente utilizando o reflexo proprioceptivo , minimizando a concentração necessária para um tiro eficaz.
Chuck Klein
Especialistas em tiro do início do século 20, como William E. Fairbairn e Rex Applegate , defendiam o tiro pontual, enquanto muitos especialistas no final do século defendiam o uso de miras. Métodos posteriores dependentes da visão incluem o método de técnica moderna de Jeff Cooper, que se tornou popular após a Segunda Guerra Mundial.
A verdade é que as distâncias muito curtas, o saque rápido numa empunhadura simples, atirando pelo quadril, você consegue atirar em um espaço físico pequeno e em pouco tempo, em que outras técnicas da época, como a do Ayoob por exemplo, não conseguiram.
O Speed Rock ganhou muita fama no mundo do tiro no século 21, principalmente com a proliferação de canais midiáticos, em que diversos atiradores inventam Drills e criam simulações de confrontos a curta distância. Entretanto é uma técnica pobre, com recurso limitado e fantasiado pelo entretenimento social.
O Speed Rock recebeu uma nova roupagem do renomado instrutor Chuck Taylor que adotou uma posição onde você saca a arma e a indexa na altura dos quadris(posição Hip Shooting) enquanto inclina o corpo para trás apontando o cano na direção da ameaça. Chuck Taylor resolveu o problema da posição décadas atrás, mas desconsiderou alguns pontos sobre a dinâmica dos confrontos armados e combate corpo-a-corpo, bem como a evolução das armas de mão, além de algumas falhas que a sua técnica possui no mundo atual, mas que seriam impossíveis de mapear naquela época.
Marcelo Esperandio
Alguns outros Instrutores estudaram a fundo a técnica e suas variações, como o Gabe Suarez, um veterano da polícia do sul da Califórnia, onde serviu por muitos anos. Sua extensa experiência de campo inclui patrulha de oficial único, fiscalização de gangues, operações especiais e treinamento tático. Ele foi um dos membros fundadores das equipes de Armas Especiais e Rifles de Precisão Tática de seu departamento.
No seu livro, Tactical Pistol: Advanced Gunfighting Concepts and Techniques, o autor já aponta considerações relevantes sobre o uso da técnica e seus pontos negativos. E complementa com uma variação da técnica, trazendo a arma mais perto das costelas, melhorando a retenção, colocando seu tronco mais ereto, numa plataforma mais estável. Ele chamou essa posição de “Close Combat Position“.
Apartir daí tivemos pouca evolução das técnicas de “Hip Shooting” principalmente do Speed Rock.
Chest Index: A evolução
Em 2017/18 eu estava focado em lutas físicas envolvendo armas de fogo, li muitos livros e manuais de Combat Close, aproveitei para treinar e experimentar muita coisa em alvos que revidam e te derrubam, usando simulacros ou Airsoft. Em 2019, mudei muita coisa no meu repertório, principalmente por experiência de rua e situações de combate real, acrescentei técnicas e táticas no próprio Combatives, trazendo uma roupagem diferente, e pouca explorada no Brasil.
Nesse meio tempo, conheci o Charneski por intermédio do Esperandio, trocamos muitas figurinhas, principalmente na porrada. Eu e o Esperandio sempre fomos obcecados por conhecimentos de porrada e tiro, se conhecemos em 2015, des daí, trocamos muitas idéias e opiniões acerca de lutas e combatividade, uma delas era o Speed Rock e sua efetividade em uma luta real.
Na observação das variações e estudos, vi uma técnica apresentada pelo instrutor especialista em combates aproximado, Craig Douglas, ex policial da DEA, com vasta experiência em campo. A técnica se chama “Thump Pectoral Index“. Achei muito interessante, até mostrei pro Esperandio, e ele também gostou, Douglas aborda vários temas da técnica, falando sobre motivos, a quebra de vetores, a realidade por trás de lutas a curtas distâncias, e a segurança da técnica.
Apartir dai, comecei a refinar a técnica e entende-la melhor, fazendo alguns ajustes ( A mesma coisa que Chuck Taylor fez com o Speed Rock), até no nome, que coloquei “Chest Index“, tradução de indexação no peito, um nome mais simples e fácil de lembrar por causa da famosa técnica Temple Index.
Chest Index Vs Speed Rock
Quando comecei a ministrar cursos de Retenção e Contra Retenção, as vezes junto com o Charneski, sempre passávamos situações em que você tem condições de efetuar disparos entretanto precisa de uma técnica eficiente que se encaixa nisso. Já tive inúmeros tipos de alunos na linha, de Black Belt, Operações Especiais, CACs, Policial Penal… E o mais interessante de tudo, é que dos mais experientes aos menos, nenhum até hoje conseguiu comprovar que o Speed Rock em um batalha a curta distância funciona.
E os que tentavam perdiam suas armas, esmagados na pancadaria e grosseria de seus colegas de treino. Isso ocorre porque estamos lidando com alvos reais, e violentos. Não é alvo de papel, seu timer aqui não adianta de porcaria nenhuma e nem o tempo que você saca e efetua disparos no Speed Rock.
A confusão maior é a ausência da visão holística em treinamentos de tiro envolvendo porrada, que coloca uma técnica isolada como remédio atômico para problemas físicos envolvendo armas. A maior mentira do mundo do tiro é sobre porrada!!!
De acordo com o relatório de 2015/2019 do FBI sobre 237 confrontos armados (Policiais X Criminosos) 44% ocorreu entre entre 0 a 1,5 m”. Apesar desses dados indiscutíveis, a maioria dos atiradores se preocupam muito pouco em treinamentos dessa temática violenta.
Estamos falando sobre técnica de Combate a Curta Distância com Armas de Fogo num tiro de retenção.
Bom as chances são de que se você postura, em neste caso de retenção, com a arma indexa perto do seu quadril (Speed Rock), tronco de frente para ameaça, seu quadril para frente (sugestivo), suas as costas arqueadas e seu peso em seus calcanhares quando você se afasta da “ameaça”. Não é uma boa opção. Aqui está o razão:
Toda a premissa da técnica supracitada, é que você está lutando, sendo agarrado, tentando impedir que sua arma seja tirada de você, um pandemônio. Então, por que treinar algo relativamente majestoso porém surreal. Postura e base. Até para receber um golpe exige uma boa base, caso contrário você irá sucumbir facilmente.
No Chest Index, é totalmente oposto, arma alta indexada ao peito, rotação de quadril, uma boa base de combate, mão reativa pode ou não ser usada para defender/atacar, ombros inclininados a frente do agressor aumentando a mecânica e a inércia.
Lembrando que varia de corpo para corpo e depende da massa dos corpos:
- Corpos com massa elevada possuem uma maior inércia.
- Corpos com massa pequena possuem uma menor inércia.
Como nem sempre ditamos onde a luta acontece e a distância, mas é nosso dever tornarmos proficiente em lutar com o que provou ser a gama de combate mais letal.
O treinamento deve ser uma batalha sem sangue, para que a batalha seja como um treinamento sangrento.
Maxim da Legião Romana
O Speed Rock nunca provou ser eficiente e prolífico atualmente em um combate a distâncias extremas, suas únicas evidências se resume em tiros no papel. E isso não é credível.
Saiba o porquê das coisas e pergunte ao instrutor ou vice-versa. Não se iluda com o “timer” e o tempo que o instrutor leva pra completar a técnica. Quando a ameaça está colada em você, o tempo pode ter relevância menor que a dissimulação, a obediência estratégica e a paciência.
Humberto Wedling
Outro detalhe é a diversidade de oponentes que você pode enfrentar nesses cenários. No meus cursos tenho o hábito de trocar as duplas durante o exercício, para mudar o rumo da luta, comprovar a eficiência das técnicas e fazer o aluno se adaptar ao adversário que enfrentar.
É uma boa idéia treinar com toda a espécie de indivíduos: altos, baixos, rápidos, desajeitados…sim, as vezes companheiros desajeitados podem surpreender um lutador mais capacitado, porque a aparente inaptidão deles funciona como uma espécie de ‘quebra de ritmo’. Embora o melhor parceiro de sparring é o lutador louco que vem atropelando, arranhando, agarrando, socando, chutando, etc.
Bruce Lee
Não é que o Speed Rock seja uma técnica ruim, mas o momento que ela é desenhada a torna ruim. Qual o lutador profissional escolheria uma técnica reativa de curta distância com movimentos motores complexos, em que seu queixo fica exposto, seu quadril inclina para trás e suas pernas ficam destabilizadas?
Nao se esqueça, independente da técnica de curta distância que você escolher você precisa ter absoluta certeza naquele momento, que sacar uma arma e disparar é legal, necessário, proporcional e razoável.
Porque nem tudo se resolve no tiro e nem todo tiro resolve tudo. O tempo e a distância são elementos cruciais nesses combates mas escassos. O tempo de resposta é maior quando o estímulo pertence a um conjunto maior de estímulos.
Conceitos versáteis que oferecem ações decisivas e responsivas ajudam o atirador a solucionar problema, com o mínimo de diagnóstico possível numa decisão rápida no “LOOP”, irá direcionar-lo a proficiência.
Diferenças e verdades
A técnica, mesmo a mais moderna, é toda constituída de bricolagem, reutilização e desvio. Não é possível utilizar sem interpretar, metamorfosear. […] Nenhuma técnica tem uma significação intrínseca, um ‘ser’ estável, mas apenas o sentido que é dado a ela sucessiva e simultaneamente por múltiplas coalizões sociais” (1993, p. 188)
Pierre Lévy
Antes de tudo, esclarecer que o Chest Index é uma posição de tiro, o Speed Rock é uma técnica de tiro, um conjunto de movimentos conectados ao tiro. É importante saber essa diferença porque apesar de uma ser evolução da outra, a sua aplicação contextual é diferente.
O Speed Rock é uma opção tática e não estratégica, você deve tratá-la como uma técnica de transição do Combate Corpo-a-Corpo para uma plataforma de tiro dinâmico, não uma resposta primária imediata. O Chest Index é uma posição de tiro para resolver problemas físicos, principalmente envolvendo pré-contato como um clinch, uma abraçada, uma sequência de socos…
Movimento é só movimento. Uma técnica agrega um conjunto de movimentos com uma finalidade para cumprir uma demanda ambiental.
M.Esperandio
Sacar a sua arma numa distância de uma luta de MMA, pode ser muito mais difícil e perigoso do que criar uma distância ou usar técnicas Combativas adequadas. Você não pode querer agir em um arena que você é a reação e seu alvo é bem vivo, se movimenta, e não está numa posição fixa.
Na luta real não pode haver percurso exato, pré-definido ou um método inflexível. Mas, em vez disso, um estado de alerta e prontidão, uma condição de estar ciente sem pré-escolha, de um jeito perceptível e maleável.
Bruce Lee
Apartir desse raciocínio, podemos dar continuidade a nossa leitura.
Como fazer o Chest Index
Para realizar um treinamento na posição do Chest Index com tiro é aconselhável tomar nota dos cuidados, posição correta das mãos e braços, postura, posição da cabeça e os detalhes da técnica. A prática em seco é um dos melhores treinos que se possa fazer para aquisição biomecânica, corporal e mental.
Depois você pode evoluir para disparos reais, fazendo movimentos lentos e pausados. A velocidade não é o ponto chave do Chest Index, diferente do Speed Rock. A preocupação é ter uma base sólida, em uma posição vantajosa.
Vamos aos pontos alfabéticos ilustrados na foto, como sendo para min os mais proeminentes da posição:
- A) aumenta significativamente minha força mecânica e resistência. Pois diferente do Speed, o pulso não é rotacionado e não fica exposto, ele está colado a lateral do meu peito, junto com meu dedo polegar bandeirado, isso evita o mau funcionamento e panes na arma. No Speed você está a favor de vários vetores, e isso é péssimo, compromete seus tiros, a posição do punho facilita a tomada do armamento pois o índice flutuante do punho dobrado se desfaz e compromete a força do pulso para retenção, o movimento de abdução do punho se torna extravagante com uma ameaça tentado esburacar sua cara ou furar você com uma faca.
- B) a posição anatômica do braço fica mais perto do centro do peitoral, dando mais força, resistência e isometria, pois o braço está em uma posição concentrica. Sem falar no acionamento da dorsal, complementar para uma ótima retenção. No Speed, a posição do punho isola os músculos do bíceps (bíceps braquial, braquial e braquiorradial) ao manter cotovelo e ombro estabilizados durante a flexão. E isso é um pesadelo na retenção.
- C) quadril orientado para ameaça e estável naturalmente, sem inclinação exageradas que comprometem sua estabilidade e sua postura na hora dos disparos. Isso é ótimo, porque mantém os sensos naturais de direção dos disparos. No Speed é quase impossível você controlar isso, pelo simples fato que a arma está mais perto do quadril , então qualquer reação de contato da ameaça interfere diretamente esses disparos.
- D) a posição visa acertar linha abaixo do peito, abdômen e quadril. Diferente do Speed que foca no quadril. Alguns atiradores inclinam suas costa para trás afim de buscar tiros mais altos, e isso é uma porcaria quando sua ameaça está a um soco de distância. Resumindo, significa que no primeiro tenho uma maior área de acerto e menor chances de erro. No segundo menor área assertiva, e mais difícil o acerto. Isso num mundo fluido, vivo e violento. Pois os alvos no stande não reagem, não correm, não gritam, não socam, não sangram, não sao agressivos… Isso muda tudo, até sua habilidade de tiro.
Considerações Finais
Bom chegamos ao final de mais um artigo, com minha intenção de não agradar a todos, pois acredito que o errado para um pode ser certo para outro. Gosto de realismo da violência polissêmica, de experimentar na carne o que funciona e o que não funciona, sou um pouco emperdenido, quando se trata de segmentos práticos e violentos. Os confrontos armados são ligeiramente contornados pelo ambiente, e as vezes sacar uma arma deixa as coisas mais complexas.
As habilidades elementares de um atirador proficiente começa na sua expertise em usar técnicas que não envolve o uso da arma, sendo assim restringindo o seu uso para situações complicadas e derradeiras.
Nas linhas da Bushistrategy, tento trazer um treinamento polido com a realidade que o atirador pode enfrentar na rua, e isso gera um prognóstico vital, metal e estarrecedor.
O maior impacto que você pode causar alguém por um ensinamento, é destruindo o que a pessoa acredita ser verdade.
Muito obrigado e até a próxima, Heeeeyyyy!!!