Sou um “CAC” da velha guarda, meu CR é abaixo de 11 mil, emitido ainda no século passado.
Tenho 52 anos, sou bacharel em direito, e ainda que nunca tenha exercido a profissão em razão dos caminhos da vida, sou um apaixonado pelo Direito e, um legalista nato.
O meu contato com as armas, começou na infância, com uma carabina de pressão Chapina que conservo até hoje. Meu primeiro tiro com arma de fogo foi aos 11 anos com uma Beretta cal. 12, com a qual meu Pai e meus tios praticavam tiro ao prato. Desde então tive diversos hobbies na vida (motociclismo, mergulho, paraquedismo) que vieram e se foram, mas as armas ficaram.
Armas e recarga de munição me ensinaram a ser atento, responsável e preciso.
I – Como eram as coisas à luz da legislação dos Ditadores Tiranos que nos escravizaram por 21 anos
Desde criança eu ia com o meu pai atirar no quartel do exército, em sítios e fazendas, pois eram muito raros os clubes de tiro. Só me lembro do Piratininga em São Paulo. Meu pai faleceu quando eu tinha 17 anos, mas o vírus já estava instalado em mim definitivamente.
Tive a minha primeira arma de fogo (registrada em meu nome) e o meu primeiro porte de arma aos 19 anos, tendo sido emancipado pela minha mãe para tanto. Inicialmente o porte, emitido pelas Polícias estaduais era válido em todo o território Nacional por um ano. Uma semana antes do vencimento, eu ia até a Delegacia de Polícia do meu bairro, levava os documentos e, em três ou quatro dias, retornava para buscar o novo, sem que não me fosse feita nenhuma pergunta. Os documentos necessários eram o RG, o registro da arma, um atestado de antecedentes e uma foto 3×4.
Em 1988 (com 20 anos) comprei um Taurus 32 do meu primo, pois precisava de uma arma pequena para porte (já que era difícil andar de Jaqueta no verão portando um S&W 6”) e para que não digam que estou mentindo, anexo a foto do Registro e do Porte, emitidos no mesmo dia!!! E vejam que o tramite de transferência da arma (feito no DP) havia sido protocolado 2 ou 3 dias antes.
II – Como passaram a ser as coisas à luz da legislação dos democratas que nos libertaram das trevas: (Leia-se FHC antes dos outros)
Após o advento do SINARM, (ou até antes) o porte emitido pelas SSP, passou a ter validade estadual, o que foi um fortíssimo golpe para mim, que viajava pelo Brasil com a minha arma. Possuía armas no exército (O SIGMA ainda não existia) mas necessitava de uma arma de porte, justamente para ter segurança nos deslocamentos. A partir de então, até que consegui cumprir a via Sacra do Porte Federal, me limitei a circular armado pelo estado de São Paulo.
O meu primeiro porte Federal demorou um ano para sair, e custou mais caro do que uma Glock, já que era necessário obter certidões em todas as UF´s, em uma época onde não se fazia nada pela Internet. Imaginem a facilidade de conseguir 27 despachantes para obter as certidões e enviar pelo correio.
O exército também se tornou um caos. Havia níveis por antiguidade, onde só se atingia o “topo” após 9 anos. Para adquirir um calibre restrito (leia-se apenas .45) tínhamos que encaminhar uma solicitação pela Federação para o DMB em Brasília e, esperar anos por uma resposta que muitas vezes nunca chegava.
Renovações de CR e CRAFS chegaram a demorar mais de um ano, GT´s eram válidas por 6 meses. Cheguei a impetrar mandados de segurança para não ficar na ilegalidade. Enfim, só dor de cabeça. Tinha que ter muito amor pela atividade para não largar tudo.
Assim, partimos de um ambiente onde o cidadão comum, poderia ter a sua arma de defesa, que comprava no Mappin, Mesbla, Casa Diana, etc e, se desejasse portá-la bastava manifestar a intenção; para outro, onde para se ter uma arma guardada em um cofre, precisamos passar por um processo de canonização sujeitos ao humor do coroinha da Igreja.
Pois bem, hoje estamos em um cenário de oportunidade que jamais foi visto nos últimos 20 anos e, temos que ser muito hábeis para aproveitá-lo bem. Na minha humilde opinião, muito barulho, pode colocar tudo a perder.
Eu acho que devemos agir como se estivéssemos com aquela namoradinha que paqueramos há muito tempo. Vamos devagar. Se apressarmos as coisas, ela pode assustar e sair correndo. Ai nos resta voltar para a paquera.
Apesar de ter obtido o meu primeiro porte de arma aos 19 anos, considero que hoje, isso seria um desastre. Eu com 19 anos era um homem feito; entretanto hoje, muitos jovens de 30 anos são adolescentes imaturos. Observem, por exemplo, que quase 60% da população carcerária no Brasil tem menos de 29 anos, o que nos dá a nítida impressão que é uma faixa de idade mais propensa a cagadas.
Assim, creio que a idade mínima de 25 anos para acesso às armas de fogo, está a nosso favor. Deixemos isso assim por enquanto.
Percebo que muitos creem que, portar uma arma de fogo equivale a possuir uma varinha mágica que colocará à sua volta uma capa blindada invisível, quando na verdade é o diametralmente oposto. Portar uma arma muda completamente a vida de uma pessoa, colocando-o constantemente em um alto nível de tensão, limitando muito a sua “liberdade” e não é para qualquer um.
Eu por exemplo, armado, me torno um bundão. Não bebo, não vou à lugares perigosos, deixo me xingarem à vontade no transito… De outra maneira, provavelmente já estaria morto ou preso.
Procuro antever cenários, de por exemplo, como seria a minha reação em uma eventual invasão de domicílio e, quando digo a alguém que se eu ver um cara levando meu carro da garagem não atiraria nele, todos riem de mim, dizendo que lhe dariam 15 tiros na cabeça. Esses não podem ter arma. É claro que não falta vontade de descarregar uma pistola em alguém que levou um bem que eu tanto trabalhei para comprar, porém se eu não atirar, terei o trabalho de ligar para a seguradora e fazer um BO. Se atirar, vou gastar o equivalente a 10 carros, ter que mudar de casa, e arrumar uma encrenca de uns 10 anos, além do risco de perder as minhas armas. Ainda não estamos nos EUA.
Enfim, tento ser uma pessoa com a consciência do exato momento em que disparar uma arma de fogo passa a ser inevitável. Não hesitaria em atirar para defender a minha família sob risco real. Já estive em situações que me permitiram reagir e por duas vezes prendi assaltantes rendendo-os sem precisar atirar, apenas aguardando o momento certo para agir com segurança. (uma vez em um restaurante e outra na rua, quando evitei que o ladrão levasse o carro da mãe com um bebê dentro… dessa vez o dedo chegou até a metade do gatilho.) Definitivamente não é algo que qualquer um possa fazer. Depende da natureza, depende de muito treinamento e equilíbrio, depende de estarmos o tempo todo praticando mentalmente o uso da arma de fogo.
Sou completamente a favor de termos o maior número de armas possível nas mãos de civis, pois creio ser difícil o congresso revogar algum dia o princípio da segurança Jurídica, evitando assistirmos o que ocorre na Venezuela, por exemplo. Assim, eu sou um armamentista convicto. Estou convicto porém, de que não sou o Rambo.
Refletindo sobre o PL 3723, honestamente não acho que foi uma má idéia a colocação dos 5 anos de antiguidade e duas armas para obtenção do porte. Não digo isso, por que não sou atingido por essa regra, mas pelo “fator da namorada nova”. Talvéz essa foi a chave que permitiu a aprovação na câmara e, essa pode ser a chave que nos permitirá começar a mudar a cultura.
Seria infantil acreditar que se todos os “CACS” (sabemos muito bem que a maioria só tirou um CR para fugir da discricionariedade do Delegado da PF) tiverem autorização para portar uma arma, não teremos gente fazendo cagadas com armas de fogo, o que pode rapidamente colocar a nossa sofrida conquista na geladeira por mais 30 anos, quando eu vou conseguir no máximo portar uma bengala.
Pensem que pela regra dos 5 anos, (quiçá) teremos uma pequena quantidade de portes emitidos, nas mãos de pessoas mais experientes que não farão cagadas. Isso diminui bastante a nossa exibição no Jornal Nacional, como possuidores de 9mm que derrubam helicópteros, e cria para os futuros candidatos ao porte, uma imagem de seriedade a ser seguida, além de evitar obstáculos à consolidação do nosso direito. Assim, a poeira vai assentando, e em alguns anos a coisa passa a funcionar sem muita gritaria.
Tenho visto em comentários na Internet com muita frequência, caras que nunca pegaram em um estilingue querendo comprar fuzil. Isso só dá munição para os globais mimizentos da Paz. Vamos acalmar essa rapaziada.
Também sou adepto da rigidez na concessão da habilitação para posse/porte de arma de fogo, inclusive com exame toxicológico. O cara deve decidir se ele prefere fumar maconha ou ter arma.
Entendam por favor que não estou apoiando uma burocracia inatingível, nem a elitização do direito, mas uma postura tal qual à da mulher de Cesar, que nos permita evoluir no inevitável debate com os desarmamentistas, que estão no congresso, no exército, na PF, e até dentro de nossas próprias casas, pois caso contrário estaremos fazendo um voo de galinha e, nunca voltaremos ao status quo ante bellum.
Assim, meus amigos, deixo a minha humilde sugestão para que sigamos nessa luta com muita seriedade e sensatez.
Como dizia a minha avó, devagar se vai ao longe. Coisa de Velho.