O sistema Safe Action da pistola Glock oferece níveis de confiança capazes de excluir uma 2ª trava de segurança externa (a primeira trava externa está no gatilho, como nós sabemos).
A arma pode ser portada com um cartucho na câmara, apontada para um suspeito ou cair no chão com total segurança. Se o policial precisar usá-la, basta que ele saque, aponte e pressione o gatilho (destravando a arma).
O sistema construiu um novo caminho para as armas modernas em todo o mundo, atribuindo ao atirador a responsabilidade pelo uso da arma. Mas, durante os testes iniciais em 1982, o Exército Austríaco solicitou um exemplar com uma trava tradicional na armação para testar (imagem 01). No final, o exército concluiu que tal trava não era necessária.
Também há relatos da mesma trava sendo usada no passado pela Polícia da Tasmânia, que posteriormente optou pelo modelo padrão. Em 2006, a polícia portuguesa decidiu adquirir 42.000 unidades da pistola Glock 19, desde que possuíssem uma trava externa localizada acima no retém do carregador (imagem 02). A engenhosidade só foi corrigida quando a polícia solicitou que as armas fossem “readaptadas para o modelo original”. Infelizmente, a Polícia de Taiwan requisitou o mesmo design da pistola portuguesa.
Da mesmo forma, a Glock produziu o modelo 19 MHS – Modular Handgun System (imagem 03) para concorrer com empresas rivais no processo de substituição das pistolas Beretta M9 usadas pelo Exército Americano. Entretanto, o exército escolheu outra marca de arma. Nessa mesma linha, seguem os modelos 17 e 19 empregadas pela polícia tailandesa (imagem 04).
Portanto, com a colocação correta do dedo indicador no gatilho, a primeira trava é desarmada naturalmente. Assim, não é preciso posicionar o polegar sobre um retém para liberar a trava externa localizada no ferrolho ou na armação com o polegar, como em outras armas.
Numa atividade aonde cada segundo conta e as habilidades motoras se deterioram com rapidez, exigir tal destreza ou nível de preocupação é criar outro grau de risco para o policial.
Quer dizer, logo após a decisão de atirar, ele precisa pressionar a trava externa na armação durante o saque ou apresentação, no máximo, sem que isso PREJUDIQUE A EMPUNHADURA.
Se ele terminar a apresentação da arma sem tê-la destravado, o tempo até o tiro irá aumentar. E se o policial esquecer a trava, não vai conseguir atirar, obviamente. Daí, o caos vai se instalar e o resultado será previsível negativamente.
Então, sabendo que o acionamento de botões e reténs, em momentos específicos (timing), ordena certo nível de habilidade motora fina e complexa; e que tais habilidades, para um ótimo desempenho, exigem pouco ou nenhum estresse, é importante saber como os policiais estão lidando com isso nos momentos de vida ou morte.
Além disso, é de se pensar na possibilidade dos policiais decidirem portar suas armas com essa trava no modo F, como forma de mitigar a dificuldade de acionamento do dispositivo.
Contudo, alterar um projeto consagrado não elimina a necessidade de APERFEIÇOAMENTO CONSTANTE do policial.
As travas externas (imagem 05) podem ser uma questão de preferência pessoal, mas servem para iniciantes com pouco controle das regras de segurança e do manejo da arma. E se existe uma profissão na qual não pode haver espaço para precariedade no treinamento ou incertezas quanto à habilidade no uso de uma arma para salvar a própria vida é a atividade policial.
Se o objetivo é evitar os tiros não intencionais, basta seguir três regras: manter o dedo fora do gatilho, se não for atirar; não apontar a arma para algo que não queira destruir e manter o treinamento e a competência no uso da arma sempre em dia.
Mesmo que essa trava adicional tenha sido uma requisição do Exercício Americano e Austríaco, é importante considerar que militares usam fuzis como arma primária e trabalham em frações maiores, com suporte aéreo e de artilharia. As polícias, enquanto isso, dependem das armas de porte como ferramenta principal e contam com poucos membros no instante da maioria das ocorrências.
Além disso, nós perdermos aproximadamente 360 policiais todos os anos no Brasil.
Finalmente, vale lembrar que a única trava do velho revólver .38 SPL sempre foi o dedo indicador do atirador.
Imagens: Forgotten Weapons, The Firearm Blog e Guns America Digest.