Causou alvoroço na semana passada o lançamento das pistolas Taurus G2C e Gx4, no novíssimo calibre .38 TPC (Taurus Pistol Caliber), desenvolvido em parceria com a Companhia Brasileira de Cartuchos. Muita gente questionou sobre essa nova munição, seu potencial para defesa e esporte, bem como com a clássica pergunta “vale a pena?”. Vamos lá!
A princípio, forçoso que se diga que o .38 TPC nasceu das bizarras restrições impostas pelo Governo Federal aos calibres nominais, especialmente nas armas curtas. Ao regredir o patamar de energia na boca de cano máxima do uso permitido para 407 J, o Governo Lula tornou os calibres de fato eficientes para defesa (9 x 19 mm, .40 S&W, .45 ACP e outros) virtualmente inacessíveis ao “afegão médio”, inclusive, pasmem, aos policiais!
Vendo esse filão de mercado, com a ampla aderência ao 9 x 19 mm na época do Governo Bolsonaro, a Taurus e CBC decidiram lançar um calibre totalmente novo, criado em 2023, que se colocasse o mais próximo possível à linha de corte de 407 J, mantendo o conceito de “permitido” ao mesmo tempo em que forneceria comportamento terminal melhor do que seu primo menor, o .380 ACP.
O .38 TPC, com notação no sistema métrico de 9 x 18 mm, fica exatamente entre o .380 ACP (9 x 17 mm) e o 9 mm Luger (9 x 19 mm), mas comparativamente mais próximo a este em termos de velocidade/energia. Cuidado para não confundir com o veterano calibre soviético 9 mm Makarov, que também pode ser notado como 9 x 18 mm mas tem características diferentes.
Conforme o material de divulgação liberado, o .38 TPC teria velocidade cerca de 40% superior ao .380 ACP e teria recuo 28% menor quando comparado ao 9 x 19 mm (o que é esperado pela reduzida capacidade de propelente do estojo). Sua energia deve girar em torno de 400 J.
O release ainda afirma que a munição Gold Hex no .38 TPC teria alcançado penetração de 14,5″ na gelatina balística, o que equivaleria a uma nota 10,0 nesse quesito. Particularmente, após 3 anos testando as munições de uso policial durante o mestrado, acredito ser altamente improvável esse resultado, salvo se o projeto da Gold Hex tiver sido substancialmente melhorado. Com gelatina devidamente calibrada, nem o .380 ACP nem o 9 x 19 mm conseguem atingir a barreira de 12″, o que força o ceticismo quanto a esse parâmetro de penetração do .38 TPC.
Imperativo afirmar que inovação e melhores opções no mercado de armas e munições sempre devem ser comemorados, especialmente no atual momento político do país. Ao que tudo indica, o .38 TPC é sim superior ao .380 ACP no campo da velocidade e comportamento terminal, atendendo melhor ao propósito de uma arma para defesa pessoal. Atirei com ele em dezembro de 2023 e, de fato, é bastante controlável e prazeroso em disparos rápidos, com comportamento mais aproximado ao seu primo menor. Mas é bastante claro que ainda faltam dados mais concretos em relação ao .38 TPC, com estudos independentes, sobre os resultados de penetração, expansão e retenção de massa, especialmente quando existentes barreiras intermediárias.
Vejo, contudo, algumas questões. Qual será a disponibilidade do .38 TPC? Todas as lojas do país receberão aportes periódicos de cartuchos ou o calibre se tornará uma “mosca branca”, como o 10 mm Auto, por exemplo? Se, por um milagre, o 9 x 19 mm voltar a ser permitido daqui a algum tempo, alguém em sã consciência compraria uma arma no novo calibre? Ainda nesse cenário, a CBC continuará produzindo o .38 TPC mesmo com índices irrisórios de vendas? Vale a ponderação.
Não custa lembrar que o .380 ACP existe há mais de 100 anos e desde então é considerado “o mínimo do mínimo para defesa”, tendo sido inclusive utilizado por Gavrilo Prinzip para matar o Arquiduque Franz Ferdinand, dando início à I Guerra Mundial, em 1914.
Em resumo, se fosse para escolher minha primeira arma, com propósito de defesa, e estivesse adstrito entre o .380 ACP e o .38 TPC, provavelmente o novato seria uma escolha melhor, hipoteticamente falando. Contudo, antes de tomar sua decisão reflita sobre as demais questões levantadas nesse artigo. Lembre-se, até o momento não há nenhum relato de assaltantes/agressores atingidos pelo novo calibre, não há dados disponíveis sobre seu comportamento “real”, fora do ambiente controlado da gelatina balística.
Como qualquer lançamento, falta maturidade operacional ao .38 TPC. Só o tempo dirá se veio para ficar ou se cairá no ostracismo, a exemplo do .41 AE e do .45 GAP, promissores na teoria mas que não ganharam os adeptos esperados por seus desenvolvedores.
Por fim, na seara do tiro esportivo, a IPSC exige como calibre mínimo para a divisão Production o 9 x 19 mm, o que impede a utilização do .38 TPC, ao menos até que a regra seja revista (se chegar a isso).
Sugestões e críticas podem ser enviadas ao Instagram @jcunhaneto12.
Até a próxima!