Você precisa viajar de avião pelo Brasil e não sabe como fazer pra levar sua arma de fogo junto? Então esse artigo pode te ajudar nessa tarefa.
Nos últimos 2 anos assistimos a um aumento significativo no número de CAC´s (Caçadores, Atiradores e Colecionadores), cidadãos que possuem permissão do Exército Brasileiro para se deslocar pelo território nacional (e até para fora do Brasil) com armas do seu acervo e respectivas munições, a fim de realizar cursos, participar de competições, ou ainda levar suas armas para manutenção ou customização.
Além disso, existe uma quantidade imensa de policiais, agentes de segurança e militares, que, por autorização legal ou prerrogativa de função, precisam se deslocar a serviço levando suas armas e equipamentos.
Em função desse aumento, essa tem sido uma das dúvidas mais frequentes que recebo pelo Instagram do LADO R, e por isso, fizemos um vídeo para o nosso Canal no YouTube abordando o assunto. Aliás, essa interação com a comunidade armamentista é o que mais nos motiva a abordar esses temas no Canal; a troca de experiências e poder ajudar as pessoas. Já se vão 5 anos no YouTube falando sobre todas as vertentes do tiro, cutelaria, aventura, comportamento defensivo e muitos mais. Então, se você gosta desses tópicos já se inscreve no LADO R pra ficar por dentro.
Histórico recente
De 2005 a 2018, a norma que regulava o tema era a IAC 107-1005, documento de caráter Reservado, elaborado pelo Departamento de Aviação Civil do Comando da Aeronáutica. A referida IAC era uma Instrução de Aviação Civil que tratava dos procedimentos relativos ao Embarque de Passageiros Armados em Aeronaves Civis no Território Nacional.
A verdade é que após os trágicos eventos ocorridos nos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, a Aviação Civil foi obrigada a sofrer mudanças drásticas, principalmente no que se refere à manutenção de sua segurança e confiabilidade. Foram criados novos dispositivos e procedimentos, em âmbito nacional e internacional, de forma a impedir, por qualquer meio, a introdução a bordo das aeronaves de todo material que possa oferecer risco à segurança das operações aéreas.
Neste contexto, foi elaborada a citada Instrução, contendo orientações necessárias ao transporte de armas de fogo em aeronaves civis brasileiras, no entendimento de que assim, este transporte pudesse ser realizado de forma segura e controlada.
Contudo, em setembro de 2016 foram iniciados estudos entre a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e a PF (Polícia Federal) com finalidade de atualizar os procedimentos da IAC 107, pois na ótica desses órgãos, a autorização para embarque armado baseava-se apenas em cargos e não avaliava a real necessidade.
A ANAC chegou a realizar audiência pública para debater o tema, onde apontou como motivação as dificuldades de padronização dos procedimentos, sobretudo nos aeródromos menores, onde a Polícia Federal não está presente, e ainda a ocorrência de incidentes com armas de fogo despachadas.
A Resolução nº 461/2018
Face ao exposto, em 25 de janeiro de 2018, foi editada a Resolução nº 461-ANAC, estabelecendo novos procedimentos de embarque e desembarque de passageiros armados, despacho de armas de fogo e de munição e transporte de passageiros sob custódia a bordo de aeronaves civis.
A principal mudança para o tema do artigo é que o embarque armado em aeronaves civis passou a ser uma exceção baseada na necessidade ou atribuição e o despacho de arma de fogo passou a ser a regra geral.
“O embarque armado em aeronaves civis passou a ser uma exceção baseada na necessidade ou atribuição e o despacho de arma de fogo passou a ser a regra geral”
O embarque de passageiro portando arma de fogo ficou restrito aos agentes públicos que, cumulativamente, possuam porte de arma por razão de ofício e necessitem comprovadamente ter acesso a arma no período entre o ingresso na sala de embarque no aeródromo de origem e a chegada à área de desembarque no aeródromo de destino.
A comprovada necessidade de acesso à arma para fins de embarque ficou limitada às seguintes hipóteses:
- escolta de autoridade ou testemunha;
- escolta de passageiro custodiado;
- execução de técnica de vigilância;
- deslocamento após convocação para se apresentar no aeródromo de destino preparado para o serviço, em virtude de operação que possa ser prejudicada se arma e munições forem despachadas.
Em resumo, a nova resolução tornou a regra mais rígida, causando prejuízo a diversas classes de passageiros autorizados ao embarque armado (por prerrogativa de função ou por autorização legal). Várias associações buscaram suspender em juízo os efeitos da Resolução nº 461, alegando excessos no uso do poder regulador da ANAC, por ter criado obrigações incompatíveis com a legislação em vigor, hierarquicamente superior a Resolução.
Como era feito antes da Resolução nº 461/2018
Antes da Resolução, quem detinha prerrogativa em razão do cargo podia viajar portando sua arma de fogo, desde que a companhia aérea fosse informada. Eu cheguei a viajar algumas vezes portando uma pistola e o procedimento era simples. Eu fazia o check-in normalmente, em seguida me identificava no posto da Polícia Federal no aeroporto. Um agente me acompanhava até um local apropriado para desmuniciar a arma (na famosa caixa de areia) e em seguida preenchia um formulário com dados pessoais e da arma. Após isso, meu bilhete de viagem era carimbado para que a empresa aérea tomasse conhecimento da anuência pela Polícia Federal.
Ao chegar na área de segurança, eu discretamente apresentava meu bilhete ao funcionário antes de passar no raio-x. Algumas vezes cheguei a mencionar “estou portando um código azul” ou “estou com Alfa Fox” – indicativo de ARMA DE FOGO, portanto, material bélico. Mas na verdade o carimbo da Polícia Federal era o sinal para que os responsáveis soubessem da minha condição e autorização. E aqui sempre ocorria um fato curioso, na minha opinião até falho, pois ao passar no raio-x, o alarme obviamente sempre disparava. Só que o funcionário que fica logo em seguida, que normalmente faz a verificação manual com detector de metais e às vezes revista pessoal, simplesmente me mandava seguir adiante. Isso por vezes me deixava constrangido e até desconfiado, pois vários passageiros em volta percebiam o fato. Os mais atentos certamente poderiam concluir que eu estava armado e por isso passando direto sem ser revistado.
No embarque, novamente os funcionários tomavam ciência da minha condição e sempre me perguntavam se eu estaria ciente das regras durante todo o trajeto e etc, sempre de modo bastante discreto.
Já no avião, após localizar meu assento, uma comissária vinha até mim e informava que o Comandante já estava ciente da minha condição na aeronave e caso houvesse outro passageiro armado no mesmo voo, me era passado o número do assento dele, e vice versa, para que ambos soubessem da existência de outros passageiros armados no voo.
Da mesma forma, sempre me avisavam que não seria possível trocar de assento durante o voo, e que nenhuma bebida alcoólica poderia ser servida a mim. Isso nos bons tempos em que era possível, pois hoje em dia nem água nos servem mais.
Como é feito hoje?
Como cabe à Polícia Federal controlar e autorizar tanto o embarque armado quanto o despacho de arma de fogo e munições em aeronaves civis, o controle passou a ser feito exclusivamente de modo informatizado. Ou seja, os passageiros interessados devem preencher previamente as respectivas guias que estão disponíveis no site da PF:
GEPAR (Guia de Embarque de Passageiro Armado) ou GDAF (Guia de Despacho de Arma de Fogo)
Além de dados pessoais e funcionais do passageiro, as guias vão conter dados do voo, tais como empresa aérea, aeródromos de origem, destino e eventuais conexões, números dos voos e localizador da reserva. Um campo é destinado aos dados da(s) arma(s) a ser(em) transportada(s), tais como: nº do SINARM/SIGMA, espécie, marca, calibre e nº de série; e ainda, no caso do embarque armado, documento oficial comprovando a necessidade do embarque armado segundo os critérios já citados, estabelecidos pela ANAC, exceto para os policiais federais da ativa.
Ao gerar a guia no site, você automaticamente vai receber um email da Polícia Federal com o arquivo em formato .pdf e um aviso de que a guia deve ser validada antes da viagem. A respectiva guia deve ser impressa em 3 vias pois a primeira fica com o passageiro, a segunda com a companhia aérea, e a última segue com a arma.
A mudança é que antes de fazer o check-in, o passageiro deve passar primeiro no posto da Polícia Federal para validar suas guias. Para isso, será pedido que a arma seja desmuniciada, e será feita a conferência da sua documentação a fim de verificar o que foi declarado na guia. No caso, arma(s) e quantidade de munições. Cabe ressaltar que em nenhuma hipótese o funcionário da empresa aérea ou o administrador aeroportuário deverá manusear a arma e as munições. Cabe ao viajante comprovar que a arma de fogo está devidamente preparada para o transporte aéreo.
Em seguida será pedido para que você guarde tudo que será despachado e devidamente lacrado. Na PF mesmo eles fornecem um saco plástico da sua companhia aérea. Contudo, a dica é levar um case que possua ou permita o uso de algum cadeado ou lacre. Digo isso porque tem cases de fabricantes que não preveem esse tipo de proteção.
No balcão da companhia aérea um funcionário dedicado ao trato com material bélico vai conferir na sua frente que a embalagem plástica ou o case vai seguir lacrado. Caso ainda não tenha feito, lacre seu material (arma e munição) na frente do funcionário e não esqueça de verificar se os dados preenchidos por ele são de fato do seu voo. Cabe ressaltar que a embalagem plástica fornecida pela empresa aérea só comporta um case de arma curta.
Lembre-se que o processo de entrega da sua arma/munição no balcão da companhia aérea deve ser feito de modo discreto. Em hipótese alguma mexa mais na arma ou munição.
Ao chegar no aeroporto de destino, procure algum guichê de atendimento da sua companhia aérea e já informe que está aguardando uma embalagem do tipo “código azul”. Normalmente esses guichês ficam próximo às esteiras por onde chegam as bagagens comuns. Um funcionário deve vir trazendo sua embalagem e fazer a entrega em mãos, conferindo sua identidade. Caso precise “esquentar” sua arma, peça para ele indicar o local apropriado, que provavelmente será uma “caixa de areia”.
Outra dica importante que já vou deixando é a seguinte: todo o processo de preenchimento feito para o voo de ida também deve ser repetido para o voo da volta. Parece óbvio mas o processo não é automático.
Recomendação
Não deixe de ler toda a cartilha de orientação que foi elaborada pela ANAC e a PF, pois a última coisa que alguém quer é ter problemas na hora de pegar um voo, correto? Lá tem todo o detalhamento necessário para que você possa fazer sua viagem despreocupado.
Adicionalmente, na página da PF existe uma parte dedicada às dúvidas mais frequentes, a qual recomendo a leitura atenta. Certamente suas dúvidas vão estar abordadas nessa seção.
Infelizmente a realidade que temos é essa. Sabidamente, a burocracia e a criação de processos redundantes são ferramentas de desestímulo para que o cidadão aos poucos vá abrindo mão dos seus direitos. Mas ainda assim o processo de despacho de arma de fogo e munições nos voos comercias dentro do país é algo factível.
Espero que este artigo te ajude. Não importa o quanto a legislação tente nos dificultar, não podemos abrir mão dos nossos direitos face às dificuldades que vão sendo criadas. A informação tem que chegar para todos, e por isso, peço sua ajuda na divulgação e compartilhamento desse artigo.
Não deixe também de conferir todo esse processo na prática no vídeo que está no nosso Canal no YouTube. Até à próxima.
Referências:
RESOLUÇÃO Nº 461 de 25/01/2018 – https://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/resolucoes/2018/resolucao-no-461-25-01-2018
Cartilha sobre embarque e despacho de armas e munições em aeronaves civis – http://www.pf.gov.br/servicos-pf/aeroportos/controle-de-armas-em-aeronaves/cartilha_embarque-de-passageiros-armados-anac.pdf
Liminar suspende instrução normativa que trata de embarque armado – https://www.pilotopolicial.com.br/liminar-suspende-instrucao-normativa-no-1062016dgpf-que-trata-de-embarque-armado/
Justiça Federal garante aos Delegados da Polícia Federal aposentados o porte de armas de fogo em voos domésticos – https://torreaobraz.com.br/justica-federal-garante-aos-delegados-da-policia-federal-aposentados-o-porte-de-armas-de-fogo-em-voos-domesticos/
Legislação Antiga sobre Controle de Armas em Aeronaves – https://www.gov.br/pf/pt-br/assuntos/aeroportos/controle-de-armas-em-aeronaves/legislacao-antiga
Medeiros, Diógenes Duarte Barros de – O embarque armado, a segurança de voo e o limite do poder regulador da ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil