Considerações Iniciais
Quando publiquei a obra “Armas de Fogo & Autoproteção”, no ano de 2015, escrevi algumas poucas páginas sobre possibilidades de reações armadas envolvendo vários oponentes. Naquela ocasião, recordo-me que quando abordava o assunto, em cursos, palestras e seminários, logo surgiam vários “pontos de vista”, alguns pertinentes do ponto de vista tático e outros fantasiosos e eficientes apenas para treinamentos.
Ocorre que em um enfrentamento nos centros urbanos, as possibilidades de ação de assaltantes, bandidos, meliantes, entre outros, poderão ser as mais diversas. Entretanto, o que costuma ocorrer é que os bandidos e assaltantes sempre agem em grupo, com a finalidade de um elemento apoiar o outro na ação criminosa.
Assim sendo, torna-se de fundamental importância que uma pessoa, ao se engajar no combate, esteja atenta para essa possibilidade e que saiba também atingir rapidamente múltiplos oponentes. Quando os alvos (ameaças) se multiplicam, aumenta também a exposição da pessoa que se defende do perigo, porém a correta atitude mental e o correto nível de alerta ao combate proporcionarão ao atirador (operador) que se defende uma relativa vantagem e possibilidade de sucesso. Portanto, é certo que a capacidade de resposta será diretamente proporcional ao treinamento realizado.
Técnicas, Táticas e Procedimentos
Na iminência do confronto e na impossibilidade de se retirar, o atirador deverá buscar, sempre que possível, algum tipo de abrigo e então disparar primeiro no oponente que está diretamente representando o maior perigo. Isso não é uma tarefa fácil de executar em uma situação de elevado estresse, no entanto deverá ser exageradamente treinado para se tornar, na hora do confronto, uma rápida avaliação de risco feita quase automaticamente.
Entretanto, se o operador já estiver engajado pelo fogo antes de abrigar-se, ele deverá tratar a situação de uma maneira agressiva antes de deslocar-se para o abrigo. Isso significa que deverá realizar, se for o caso, o tiro em movimento. Aqui vale uma observação de bastante significado, ou seja, o objetivo principal, nessa situação, passa a ser a proteção do operador pelo auxílio de um abrigo. Então a primeira preocupação é correr o mais rápido possível para um abrigo, porém se o cenário permitir, e a situação exigir a execução de fogos sobre o agressor, isso deve ser feito de forma dinâmica e agressiva, como um meio para se atingir o fim que é e ocupação do abrigo.
Ainda, é necessário dar atenção ao fato de que, se o obstáculo protege o atirador somente de alguns oponentes, no momento em que se abriga, ele deve primeiro atirar na direção de ameaças que conseguem visualizá-lo.
Em uma situação de combate com múltiplas ameaças é vital que o operador efetue disparos rápidos em cada homem e se movimente para sair da posição em que se encontra e, após, continue disparando de acordo com a necessidade tática. Mesmo cessando a ação hostil, a arma deverá permanecer em condições de uso.
O que não se deve esquecer é que, se o disparos não forem eficazes, o primeiro oponente ainda estará de pé e comprometerá o desenvolvimento da ação do operador. Os olhos do atirador deverão funcionar como um “flash”, captando rapidamente as imagens para formar um quadro tático. Nessa situação, a visão periférica, juntamente com a eliminação da exclusão de auditório (não percepção dos sons a sua volta), determinará em muito o sucesso ou a derrota do operador no combate.
A sequência tática dos disparos pode certamente ser questionada, porém o mais rápido e natural é que o atirador execute alguns disparos em cada um dos oponentes (da esquerda para direita ou o oposto), isso vai depender muito da habilidade do atirador e da posição em que os oponentes estejam, voltando a disparar novamente em cada um, no sentido oposto, ou seja, o oponente que recebeu o último tiro será o primeiro indivíduo a receber o disparo na nova sequência tática. Isso não quer dizer que cada oponente receberá somente um disparo de cada vez, pois vários elementos técnicos, táticos e operacionais vão corroborar para essa dinâmica.
Não se deve esquecer que uma pessoa recebendo apenas um disparo poderá cessar a atitude hostil, enquanto outros precisariam de mais disparos. Trata-se de uma questão fundamental entender isso, pois quando se retorna disparando no sentido oposto, a visão periférica tem que também ser eficiente para evitar disparos em pessoas que estejam por perto, tendo em vista que uma das ameaças já poderá estar inabilitada com o primeiro disparo que recebeu e não “merecer” o segundo ou terceiro. E o complicador, pode ser que a sequência de disparos não obedeça essa formação linear.
Conclusão
Disparar em múltiplos alvos não é fisicamente difícil. Existe um intervalo de tempo entre os tiros, que os competidores chamam de “tempo fixo”. O tempo fixo ocorre entre o ponto quando o primeiro tiro realmente dispara e o ponto quando a pistola se realinha no alvo depois do ciclo do recuo da arma. Esse tempo fixo varia entre 0,25 e 0,50 segundos, mais o menos, depende muito da habilidade do atirador e deverá ser usado para mover a pistola de um alvo a outro. No entanto nessa situação não existem pessoas enfurecidas atirando no operador e ainda em uma situação de combate o mesmo estará sob total efeito do estresse e se movimentando, buscando um abrigo para proteção e obviamente não estará usando os aparelhos de pontaria da arma como em uma situação desportiva.
Acreditar que um meliante estará sozinho durante uma ofensiva contra pessoas inocentes é tão irresponsável quanto achar que basta dar um ou dois tiros que a ameaça será cessada. Dentro dessa concepção, deve-se sempre considerar a hipótese de se buscar outras ameaças e sempre, sempre mesmo, realizar múltiplos disparos, buscando um abrigo.
É unanimidade, entre os especialistas, que não existem respostas fáceis para enfrentamento com múltiplas ameaças, contudo o treinamento dinâmico certamente facilitará operações dessa natureza. O mais importante será o estado de atenção – os conhecidos níveis de alerta em que a pessoa estará ao perceber que se encontra em uma situação assim.
O defensor, ao estar alerta, fará o ciclo OODA – Observa, Orienta, Decide e, se for o caso, Age. Assim, perceberá, que o problema se apresenta e se aprontará para a ação, fazendo uma rápida análise de risco e criando um eficiente cenário tático a seu favor.