Introdução
Em nosso dia a dia, ao desenvolvermos nossos afazeres, estaremos em contato com diversas pessoas. Desde a nossa saída de casa até o nosso retorno, no fim da jornada diária, cruzaremos e interagiremos com pessoas de diversas origens e costumes.
Nessa complexa conexão interpessoal, será impossível prever com precisão todas as possibilidades de ações hostis contra nós ou contra pessoas nas nossas proximidades, pois infinitas variáveis poderão ocorrer, tornando cada fato único e específico.
No entanto, a imprevisibilidade das ocorrências não poderá ser motivo para nos descuidarmos ou mesmo agirmos “contanto com a sorte”. Deveremos, sim, planejar ações prévias – dentro de um contexto de possibilidades – no intuito de fazermos frente a imprevistos que possam ocorrer. Isso não será a garantia do sucesso, mas será o início de uma vantagem sobre possíveis ações que possam tentar nos vitimar.
A partir de então, provavelmente surgirá a dúvida de quais medidas na práticas deveremos tomar. E ainda, como se colocar em prática as medidas escolhidas.
A resposta não é simples, muito menos objetiva, mas deve ser baseada em um SISTEMA, que aqui será denominado de SAP – Sistema de Autoproteção.
O Sistema de Autoproteção
Na prática, quando procuramos nos proteger, teremos algumas opções. Essas opções devem se tornar elementos importantes dentro de um sistema. Nesse sistema, cada elemento pode ser acionado individualmente ou transpassado para o outro, devido ao fator necessidade. Por fim, todos esses elementos, ao serem suscitados e colocados em possibilidade de uso, formarão o que conhecemos e denominamos “Sistema de Autoproteção” (SAP).
Um sistema, bem verdade, é um conjunto de elementos que interacionam. A interação entre os elementos é considerada de muita importância e vital para que um conjunto de elementos possa ser considerado um sistema, pois um conjunto de elementos sem interação entre eles, de nenhuma maneira pode ser considerado como um sistema.
O SAP é composto por 05(cinco) elementos, cada um com sua finalidade e que podem ou não depender um do outro, conforme a seguir elencados:
- PREVENÇÃO
- NÃO REAÇÃO
- NEGOCIAÇÃO
- FUGA
- REAÇÃO
1. Prevenção
A prevenção é a melhor forma de proteção. Este elemento deve ser buscado sempre que necessário, por meio de trabalhos de análise de riscos e estudos de situações. Ao empregarmos este elemento, naturalmente minimizaremos os riscos de aplicarmos os outros, ou mesmo os aplicaremos, se necessário, com melhor eficácia.
É importante registrar que o delinquente escolhe suas vítimas pensando em quais serão os riscos, em comparação aos benefícios, que serão alcançados. Gary Becker, prêmio Nobel de Economia em 1992, destaca que os criminosos pesam as vantagens e as desvantagens de cometer um crime, como a probabilidade de serem capturados em contraposição aos lucros que alcançariam com o crime praticado.
A escolha da vítima envolve levantar informações e planejar a ação criminosa; é neste ponto que a maior parte das pessoas tem a opção de se tornar um alvo mais difícil. Antes de pensar em reagir em uma situação de confronto, devemos mudar nossos hábitos de vida e começar a adotar pequenas regras no dia a dia para diminuir o risco de nos tornarmos vítimas.
Nessa senda, a busca por elementos preventivos torna-se extremamente necessária. Deve-se tentar compreender os métodos de investida dos marginais e adotar mudanças de hábito, como mudar o itinerário do trabalho de vez em quando, assim não nos tornaremos vítimas fáceis escolhidas pelos delinquentes. Outro elemento muito importante é manter a atenção, pois muitas vezes, apenas o fato do marginal perceber que a potencial vítima notou sua intenção, já desestimula sua investida.
2. Não reação
Existe uma cultura, inclusive amplamente apregoada por jornalistas e alguns especialistas da área de segurança, que nunca devemos reagir. Claro que isso não é uma verdade absoluta, pois somente quem estiver vivenciando o calor da ação poderá fazer uma análise das circunstâncias e decidir pela reação ou não.
No entanto, quando não foi feita ainda uma avaliação dos riscos, deve-se buscar não reagir. Várias situações podem se tornar mais vantajosas, mesmo que se pareça um pouco injusta, ao se tomar a atitude de não reagir, por exemplo, quando ficar bastante claro que as perdas serão apenas materiais ou a desvantagem em detrimento da ação do oponente for clara e eminente.
A não reação pode ser inclusive uma preparação para a fuga, para a negociação, ou mesmo uma adequação para uma reação em em alguma outra oportunidade mais adequada e ainda dentro da ocorrência.
Assim sendo, a não reação também deve ser considerado um elemento importante do SAP, e não é covardia alguma fazer uma análise e, pelo sopesamento dos fatores, tomar essa atitude de não reagir.
3. Negociação
A negociação é uma atividade de muita peculiaridade, pois só deve ser buscada se o oponente der espaço para isso, caso contrário, poderá se tornar agravante. Serve para dissuadir o adversário ou mesmo minimizar a violência da ação hostil, sendo ainda uma opção de fator “ganho de tempo” até surgir uma oportunidade de Fuga ou de Reação.
Deve-se tomar muito cuidado para buscar entender qual a intenção dos marginais, pois não será tarefa fácil dialogar com seres inescrupulosos na prática de atos de violência e por vezes alterados por efeitos de drogas. Entretanto, o elemento negociação, como já visto, pode ser a única janela de preparação que o agente terá para combater ou mesmo fugir. Sendo assim, não deverá ser negligenciado, se essa for a opção.
4. Fuga
A fuga não deixa de ser uma opção de defesa, e deverá ser realizada se a desvantagem for excessiva em relação ao(s) oponente(s), ou até mesmo para evitar um conflito que trará consequências devastadoras.
Se existem vários meliantes armados e o agente está sentado perto de uma porta, em um estabelecimento comercial, por exemplo, que permita a sua saída em segurança, por que não assim fazer e solicitar apoio, ligar para polícia ou mesmo traçar outra estratégia?
Observa-se que este elemento está bastante ligado ao primeiro – prevenção, pois se o agente está prevenido, encontrando-se em um correto estado de alerta, poderá evitar se colocar em situações naturalmente perigosas.
5. Reação
Certamente este é o elemento (ação) que mais parece justo de ser ativado, porém deveremos ter em mente suas consequências diretas e indiretas. Contudo, se esta for a opção, deve ser consubstanciada da capacidade de podermos controlar toda a situação e o adversário; para isso, o primeiro controle deverá ser sobre nós próprios, com a decisão de como e quando reagir.
Para reagir, deve-se, além de muita capacidade técnica, tentar primeiro entender a intenção do marginal e, ao mesmo tempo, analisar seu comportamento e executar uma breve avaliação de risco. Esses itens são medidas fundamentais para a sobrevivência.
A análise do comportamento deverá ser feita por intermédio de “leituras” do indivíduo – deverá ser feita a leitura dos sinais verbais e não verbais do marginal. Um indivíduo drogado, bêbado ou com nervosismo excessivo, pode, mesmo por descuido, acidente, ou imperícia, matar a vítima e, obviamente, se forem demonstrados sinais semelhantes pelo marginal, maior será a necessidade de uma possível reação.
De acordo com Betini (2011), em dados compilados nos relatórios “LEOKA/FBI”, dos últimos 15 anos, menos de 1% dos confrontos que envolveram policiais norte-americanos, provocando suas mortes, ocorreu de forma inesperada. No restante, em mais de 99%, houve alguns indícios e “avisos” de que caso tivessem sido observados, poderiam ter proporcionado ao policial antecipar-se à ação criminosa.
O agente deve entender que a avaliação de risco é um estudo rápido, dinâmico e objetivo, em que se coloca em questão a nossa capacidade de reação em relação ao inimigo, ponderando a distância que nos encontramos, o equipamento e as armas que utilizamos, tudo em comparação com as possibilidades do oponente.
Conclusão
Ao analisarmos os elementos elencados, temos uma clara noção de que a aplicação do Sistema de Autoproteção, com sucesso, depende naturalmente do comprometimento do operador e da preparação que o mesmo se predispôs a fazer.
O SAP, apesar de óbvio é complexo. Pois se o seu operador não estiver atento, prevenido e ativado em um correto nível de alerta, provavelmente não conseguirá obter sucesso nas tomadas de decisões. E as decisões quando tomadas em uma situação de confronto não poderão serem anuladas ou reparadas.
Esse sistema não é imutável, mas parte da premissa que toda e qualquer ação deve está lastreada em um elemento base e esse chama-se “prevenção”. Se não o mais importante do sistema, deve ser considerado pelo menos imprescindível.
Isso posto, o sucesso não estar em tentar adivinhar o que pode acontecer e sim em estarmos preparados e prontos para enfrentarmos o que vier a acontecer, para isso usamos um sistema que nos levará da calmaria até o combate com melhores chances de sobrevivência.
Por fim, a decisão de como usar os elementos do sistema é iminentemente sua.