Beabadotiro por Luciano Lara
Estamos todos sendo bombardeados com expectativas e previsões sobre o futuro da lei de armas no Brasil, com a marcação de data para continuidade do julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) em curso no STF para o próximo dia 17 de setembro.
Após alguns votos conturbados, com absolutamente nenhuma técnica a respeito da matéria específica em julgamento, a balística, desconhecimento completo da realidade fática da matéria, profunda carga ideológica e questionável acerto jurídico, desrespeitando inclusive o regramento dessa espécie de ação constitucional e seu procedimento específico, vemos se aproximar data de reinício de votação sobre o tema.
E aqui digo sobre o tema porque as ações deixaram de ser sobre a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos dos decretos presidenciais questionados: mesmo tendo os relatores em seus votos fixado a questão quanto aos artigos desses decretos questionados pelos proponentes dessas ações, partidos de esquerda acompanhados de institutos e organizações não governamentais desarmamentistas, ainda assim ao fundamentarem seus votos ampliaram e incluíram no julgamento assuntos e conceitos sequer visados pelas ações propostas.
Tecnicamente avançaram e aproveitaram o tema das ações e estão utilizando esses processos como pano de fundo para aplicarem o seu entendimento sobre a matéria em clara manifestação de “não gosto, não concordo e mesmo desconhecendo o assunto, voto por proibir”.
E isso mesmo depois de o STF ter declarado a Lei de Armas constitucional quando analisou porte de arma a procuradores de estado.
Pior que isso, em um voto mais preocupante o assunto desarmamento é elencado como política de estado com caráter constitucional, o que, para alguns, geraria impedimento inclusive de propostas legislativas contrárias a essa tal política.
Baseia-se tal voto nas premissas de que o Estado brasileiro ao tutelar a vida e a dignidade da pessoa humana estaria por elencar o desarmamento como política de estado visando impedir mortes por arma de fogo.
A perspectiva e narrativa pode até fazer sentido a alguém mais afoito, mas não poderia estar mais fora da realidade nem mesmo poderia sequer ser cogitada se, ao menos, buscássemos saber sobre o que está se falando ao invocar tais fundamentos.
Trata-se o raciocínio empregado da forma mais fácil de forçar uma conclusão e ele vem sendo utilizado, inadvertidamente, há décadas no Brasil quando o assunto é armas de fogo e munições.
Ninguém apoia o emprego de armas de fogo ilegais para a prática de crimes por bandidos que as utilizam criminosamente para subjugar a população. Óbvio ululante.
A estratégia está em se partindo de premissas válidas, forçar silogismo deturpado, induzindo o cidadão a erro para chegar à conclusão pretendida pelo brilhantismo da lógica equivocada. Explico.
Ao se afirmar que o Estado brasileiro se rege pelo direito à vida e a dignidade da pessoa humana, está se partindo de fato incontestável e expressamente previsto nos primeiros artigos da Constituição Federal que tutelam os princípios fundamentais da criação do Estado Brasileiro.
Ocorre que nesses mesmos princípios está textualmente colocado que o poder emana do povo que o exerce por meio de seus representantes ou diretamente, e por esse poder a população já se manifestou em maioria de 63% dos votantes, representando 60 milhões de brasileiros naquele ano dizendo que SIM queriam a liberação da venda de armas no Brasil, SIM queriam ter direito a ter e usar armas de fogo.
Simplesmente não se pode estabelecer como política de Estado nada que divirja dessa manifestação expressa e direta da população brasileira que há época contava com 186 milhões de habitantes e desses 60 milhões (contra 30 milhões que votaram contra as armas) disseram qual a vontade popular sobre o tema.
Não pode, seja quem for a pessoa ou qual cargo ocupe, manifestar sobre política de estado ou vontade popular, algo não condizente com aquele escrutínio. SIMPLES ASSIM.
Com isso, por óbvio, não quero dizer que as pessoas não têm direito a opinião e gosto. Claro que tem direito e quem gosta de basquete que jogue a bola ao cesto, quem gosta de tênis que compre e use a sua raquete para acertar a bolinha.
O que estou dizendo, e o que a CONSTITUIÇÃO estabelece, é que defendemos o seu direito a opinião e respeitamos a sua liberdade de expressão MAS o poder emana do povo e a soberania popular é que determina as POLÍTICAS DE ESTADO, seja pela criação deste através do constituinte originário, seja pelas formas de manifestação do poder, direta ou por representantes.
Isso quer dizer que não pode um Ministro do STF, por ideologia, gosto ou achismo estabelecer política de estado como sendo aquilo que o POVO SOBERANO não disse ser seu interesse.
Tal decisão é INCONSTITUCIONAL por vício formal e, portanto, não pode gerar efeitos práticos.
Não quero usar de juridiquês, e sempre tentei me pautar nos textos e conteúdos que produzo, mesmo que relativos a questões legais, em ser o menos formal possível, mas fato é que a questão é de alta complexidade, no sentido de discussão da inconstitucionalidade de decisões da Suprema Corte ou mesmo de emendas constitucionais inconstitucionais, matéria tormentosa na doutrina e jurisprudência mas altamente relevante e em voga, especialmente em momentos em que se questiona inclusive a legalidade, que se o diga a constitucionalidade de atos praticados por quem é o Guardião final da Constituição, o nosso Tribunal Constitucional por excelência.
Fato é que não se pode suprimir o direito natural a legítima defesa por uma canetada.
Fato é que não se pode excluir um esporte simplesmente por não se entender do assunto.
Fato é que não se pode, por achismo, pautar definição de calibres permitidos, restritos ou proibidos quando não se sabe para que lado sai o disparo mesmo que olhando um cano de frente.
Fato é que não se pode acreditar tutelar o direito a vida correlacionando armas legais com mortes, sem que haja sequer um estudo que correlacione esses dados, ao que me refiro no já publicado artigo, com link ao final, não existe correlação entre armas legais e crimes praticados simplesmente porque não há esse dado compilado por nenhuma secretaria de segurança pública do país.
Partindo da premissa, que é ou deveria ser, comum a todas as pessoas de que não se aceita armas ilegais na prática de crimes, se vulgariza a utilização da arma de fogo somente como sendo instrumento de crime e de criminosos, o que é absolutamente falso e os mais de 400 mil CAC do país além de todos os que portam armas funcionalmente ou para defesa pessoal demonstram todos os dias.
Quando alguém se apropria do direito de defesa à vida e o faz alegando que a arma do cidadão de bem gera perigo à segurança pública o que se está dizendo, em última análise, é que o direito de defesa dessa vida deve ser mitigado e que se deve buscar outro meio necessário para se repelir a injusta agressão que não o equalizador de forças por excelência que é a arma de fogo em última análise.
Mas, para além disso, essa arma de fogo é instrumento de esporte, desde o esporte olímpico com todas a modalidades que lhe são permitidas MAS E TAMBÉM a todas as demais modalidades esportivas não olímpicas e que são inúmeras e sobre as quais temos vários representantes de destaque nacional e mundial, e que não podem ser ainda mais prejudicados além da pesada burocracia a que se submetem, da enorme carga tributária a que estão submetidos, e das dificuldades todas que envolvem se dispor a desempenhar um esporte que tem preconceito até entre os seus praticantes, fruto das décadas de desinformação e ideologia com que a matéria é tratada pela minoria (éramos 63% em 2005 e hoje somos muito mais) que grita alto sempre que um criminoso pratica um crime com uma arma fria.
E aqui reside a falha crucial na lógica deturpada utilizada: não é o instrumento o culpado pelo ato praticado é o seu utilizador, o criminoso.
Não são as armas as culpadas pela criminalidade, são os criminosos que não tem CR, não tem nenhuma das atividades apostiláveis ali registrada e não demoram meses ou anos para conseguir um armamento depois de toda a hercúlea missão documental para o adquirir legalmente, criminosos esses que sim o fazem de forma ilegal e clandestina e NÃO SÃO NEM SERÃO alcançados por qualquer dessas decisões que hoje estão sendo processadas.
Estes criminosos já não foram alcançados pela Lei de Armas e o malfadado desarmamento implementado mesmo após a decisão popular de 2005 que só fez ver cidadão de bem entregando sua arma dada a burocracia e os custos criados para apoiar essa política.
E repeti, e repito, cidadão de bem, termo também questionado nesses processos que vemos sendo julgados, criticado por se dizer que não deve haver distinção entre as pessoas, ao cidadão deve haver o mesmo tratamento e o mero utilizar “cidadão de bem” estaria por se buscar criar narrativa autorizadora para o emprego de armas de fogo.
Agora parem um minuto meus amigos e entendam o que se pretende: para justificar o desarmamento civil busca-se equiparar o pai e mãe de família, o trabalhador pagador de impostos com o criminoso que vive de ofender a sociedade, pois segundo a julgadora não há distinção entre eles.
Só que ao criminoso a Lei de Armas pouco ou nada faz, eis que não o inibe de adquirir, possuir e portar a arma fria utilizada para ofender o cidadão de bem, e esse cidadão de bem, que nem assim pode ser chamado, deverá permanecer refém, cordeiro e sem sequer ter meios de tentar, se quiser e puder, se defender do criminoso que nada teme.
O ESPORTE E AS ATIVIDADES DERIVADAS
O esporte se desenvolveu como nunca antes se viu.
Os clubes de tiros foram abertos as centenas, lojas de armas e munições foram abertas aos milhares, inúmeros empregos foram criados, milhares de armamentos foram vendidos e estão nas mãos de cidadãos de bem que não cometeram e continuam sem cometer qualquer crime com essas armas, e tudo isso não foi em vão e não poderá ser desconsiderado.
Não se pode esperar que mais de 400 mil pessoas sejam prejudicadas e afetadas porque do dia para a noite alguém que nada entende de armas e munições resolva equiparar criminoso que se utiliza do armamento ilegal para praticar crime com o praticante de atividade constitucional e legalmente utilizada para fins lícitos, regulares e altamente fiscalizados.
Ainda que seja juridicamente provável que se implementem decisões ilegais, já que é claro na Lei de Armas a quem compete estabelecer os parâmetros sobre cada instituto nela previsto, essas não podem caminhar para a INCONSTITUCIONALIDADE por absoluta ofensa a soberania popular e essa foi clara e democraticamente declarada em 2005 ao dizer que NÃO PROIBE A VENDA DE ARMAS E MUNIÇÕES NO BRASIL.
Porte de arma, porte de trânsito, transporte desmuniciado, armas e calibres com suas diversas aplicações e finalidades, uso permitido, restrito e proibido e tudo o quanto se refere ao técnico-jurídico sobre o tema está amplamente previsto no ordenamento jurídico e ainda sim vemos todos os dias sendo tomadas decisões por aplicadores do direito que ignoram essa especificidade das normas sobre armas.
O que já é triste realidade pode se tornar terrível pesadelo se, uma corte constitucional, ao arrepio da soberania popular e desrespeitando as previsões legais existentes, por pura ideologia e desprovida de qualquer fundamento técnico-jurídico válido, desconstituir sistema legal altamente restritivo e fiscalizatório existente sobre as modalidades de utilização do armamento no país.
Em última análise, se as restrições forem como as que se busca implementar pelos votos já proferidos, estar-se-ia a inviabilizar a comercialização desses produtos no Brasil, ferindo-se inclusive um outro princípio fundamental do estado brasileiro o de defesa da livre iniciativa.
Todo o sistema criado e implementado nesses últimos 05 anos (e que não se referem apenas ao atual governo, e ainda que se queira atingi-lo com as ações em curso) podem afetar também economicamente um mercado em ampla expansão, lícito, fiscalizado e altamente regulamentado por diversos órgãos estatais, e que mesmo assim se desenvolve exponencialmente.
Não é pelo gosto de um juiz que se decide qual arma ou qual calibre pode ser utilizado seja no esporte, seja na defesa, seja na caça, muito menos os seus valores ideológicos podem servir de base para se desrespeitar a Soberania Popular e o sistema legal vigente.
O constituinte originário ao estabelecer os fundamentos do Estado Brasileiro o fez para tutelar o cidadão, de bem, prevendo ao acusado pela prática de crime inúmeras garantias que ,protegendo seus direitos individuais, efetivam a proteção final ao bem estar público e os interesses da população de não ser vitimada e de não ser feita refém da criminalidade.
Defesa da vida e da dignidade da pessoa humana se faz garantindo ao cidadão, de bem, que ele não venha a ser molestado em seus direitos fundamentais, dentre os quais a sua liberdade, seu lazer, sua prática desportiva, sua atividade recreativa, seja ela qual for e em especial se for a mais regulamentada e fiscalizada atividade do MUNDO, que correspondem a todas aquelas envolvendo o tiro, tal como hoje é disciplinada essa atividade no país.
E quem não gosta de tiro que vá jogar basquete, tênis ou peteca. Gosto é gosto e cada um tem o seu, o que não lhe dá o direito de impor o seu achismo sobre qualquer atividade como sendo a única forma de pensar existente, já que num Estado Democrático de Direito, cujo fundamento é o Soberania Popular, essa se sobrepõe, sempre, à minha vontade pessoal, independente do cargo que eu ocupe.
Tenhamos fé, e se essa não bastar tenhamos força para buscar reparação quanto a eventuais equívocos, porque decisão judicial que vise mitigar princípios fundamentais de criação do Estado Brasileiro, proveniente de que órgão for, é inconstitucional, podendo e devendo ser anulada.
O que se espera dos votos ainda a serem proferidos sobre o tema é que respeitem e se pautem no que é direito posto e não na vontade ideológica pessoal do julgador.
Fiquem vivos, não caiam em contos do vigário, não se deixem levar por silogismos deturpados, estudem sempre, treinem muito e até a próxima, porque o tiro no Brasil não acaba essa semana.
*texto corrigido 12h49mins por erros de digitação